Dheison Renan da Silva diz que é “petista desde a barriga da mãe”.
Criado no Jardim Eliana, bairro que fica no distrito do Grajaú (Extremo Sul de São Paulo), ele é neto de Francisca Narcisa da Silva, a Chica da Silva, paraibana que migrou para a capital paulista na década de 1970, se instalou na periferia e logo virou referência local ao reivindicar direito à moradia e melhorias no bairro.
“O Grajaú foi a minha principal referência política (…) Desde pequeno eu nasci nesse ambiente, onde essa luta política passava pelo debate do território, do não uso da cidade, do direito das pessoas terem moradia, de ter educação, creche, etc” – Dheison, eleito vereador pelo PT
Sua avó foi uma líder comunitária que ajudou a fundar o diretório do Partido dos Trabalhadores na região e se candidatou a deputada estadual em 1982 e vereadora em 1988, sem conseguir se eleger. Mas hoje, aos 86 anos, ela vê o neto de 36 chegar à Câmara Municipal da maior cidade do País.
“Eu sou a criança que cresceu nas assembleias do movimento de moradia, que corria no meio e atrapalhava as reuniões do partido”, brinca ele.
Para quem foi integrante de grupo de teatro e grêmio na escola, militou na Juventude do PT e trabalhou como assessor parlamentar e secretário de governo em Diadema (SP), a candidatura seguiu um curso esperado.
Eleito com mais de 30 mil votos, Dheison carrega esse histórico familiar e comunitário para a casa legislativa paulistana a partir de 2025. Ele será um de 18 parlamentares de oposição ao prefeito reeleito Ricardo Nunes (MDB), que chega com uma base majoritária entre as 55 cadeiras da Câmara.
Dheison avalia que os próximos quatro anos serão desafiadores. Eleito pelo voto popular, Ricardo Nunes deve intensificar o sucateamento de políticas públicas e terceirização de diversos serviços (da cultura à educação, da saúde ao serviço funerário), enquanto responde a escândalos envolvendo sua gestão.
Mais do que isso, o parlamentar estreante se preocupa pela guinada à extrema-direita do político que há uma década fazia parte da base do então prefeito petista Fernando Haddad.
“A partir do dia 1º de janeiro, nós vamos ter um Ricardo Nunes bolsonarista com um vice [coronol Mello Araújo] indicado pelo Bolsonaro. Vale lembrar que os vices são muito importantes na cidade de São Paulo. O Bruno Covas era vice do João Dória. E o Ricardo Nunes, vice do Bruno Covas. Então, será que esse coronel pode virar o nosso prefeito?”.
Agora, com mais bolsonaristas na Câmara e dentro do governo, o novo vereador não espera uma gestão que respeite as regras do jogo democrático.
Periferias em disputa
Com a vitória de Ricardo Nunes sobre Guilherme Boulos (PSOL) em quase todas as zonas eleitorais da cidade – o deputado federal ganhou apenas em três -, analistas da política se apressaram em dizer que a esquerda havia perdido a preferência nas periferias.
Porém, em um cenário de avanço conservador no Brasil e em diversas partes do mundo, Dheison celebra a manutenção dos votos para a candidatura de esquerda na Prefeitura e o aumento quantitativo dos votos para a Câmara.
Agora, ele diz que é o momento de reforçar e disputar os corações periféricos.
“Eu acho que quem saiu da base tem que voltar mesmo, mas quem já está na base tem que entender essa nova base. Quais são os anseios da periferia, hoje?”, questiona.
Para Dheison, o sistema capitalista passa por uma mudança que impacta na percepção política da população.
A busca pela qualidade de vida explicaria o desejo de empreender, que se reverte em votos em candidaturas geralmente de direita, que apresentam propostas milagrosas para o público.
“Mas a periferia é empreendedora desde sempre. Eu lembro da minha infância de ver as pessoas colocando placa de ‘vende-se geladinho’, as senhoras que iam de casa em casa vender produtos da revistinha da Avon. É um sentimento de tentar melhorar sua qualidade de vida, de incrementar a sua receita”.
Por isso, Dheison entende que é necessário disputar esse sentimento e apresentar perspectivas de geração de riqueza com acesso a direitos no próprio território.
Entre as apostas, está o fortalecimento dos comércios locais, do esporte amador como o futebol de várzea e da cultura periférica como fator de geração de trabalho e renda.
“Se a gente for pegar o que movimenta o entorno das rodas de samba, é um negócio fantástico (…) A gente precisa sentir essa nova economia que está presente na periferia”.
Thiago Borges