Da esquerda à direita, candidaturas periféricas defendem segurança na quebrada mas com visões diferentes

Da esquerda à direita, candidaturas periféricas defendem segurança na quebrada mas com visões diferentes

Conversamos sobre o assunto com Elaine Mineiro do Quilombo Periférico (PSOL), Jussara Basso (PSB) e Emerson Rosa (Partido Novo), pessoas negras e de quebrada que concorrem à Câmara Municipal de São Paulo nas eleições de outubro

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Por Marcelo Lino Jr. Edição: Thiago Borges. Artes: Rafael Cristiano

“Quero mostrar para as pessoas que o negro pode ocupar o espaço que ele quiser”.

A fala é de Emerson Ramos, advogado negro de 30 anos e morador do Grajaú (Extremo Sul de São Paulo) que se define como antirracista. O lugar que ele quer ocupar é a Câmara Municipal, para a qual concorre nas eleições de outubro pelo Novo.

O partido de direita neoliberal tem como postulante à Prefeitura a economista Marina Helena. Branca como a e os 9 demais concorrentes ao cargo executivo, ela não cita direitos humanos em seu plano de governo, defende a redução do Estado e trabalhou no governo de Jair Bolsonaro. Mas Emerson não vê incoerência em se aliar a ela.

Emerson conta que entrou para a política para questionar pesos e medidas diferentes do governo e a indignação com o que ele chama de “duas realidades diferentes dentro de uma mesma cidade”.

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Neste ponto, ele tem uma visão similar à da vereadora Jussara Basso (PSB), 48, que também é negra e se candidata à permanência no cargo no partido que tem Tabata Amaral na disputa da Prefeitura.

“São mais de 12 milhões de habitantes e você tem uma diversidade territorial e populacional imensa. Você olha para São Paulo e aquilo que é o centro expandido difere muito daquilo que é a periferia”, observa a parlamentar, que é militante antiracista.

Um exemplo disso é o investimento na Guarda Civil Metropolitana (GCM), proposto por boa parte das coligações na votação deste ano em resposta à sensação de insegurança apontada pela maioria da população.

Em São Paulo, trabalham pouco mais de 7 mil agentes da GCM. No ano passado, mil agentes passaram a integrar ao sistema a um custo adicional de R$ 110 milhões.

Porém, o gasto não é feita de forma equânime. Na Cidade Tiradentes, por exemplo, apenas uma viatura da GCM é responsável pela ronda escolar na região.

“Parece que em outros cantos da cidade a gente vive numa cidade maravilhosa. Os carros de numeração que deveriam estar lá, estavam no centro”, aponta Emerson.

“É óbvio que a região central também precisa de segurança da GCM. Mas essa Prefeitura faz uma gestão que, mais uma vez, privilegia essa sensação de segurança no Centro e faz com que as regiões periféricas sejam descobertas”, denuncia Elaine Mineiro (PSOL).

Elaine Mineiro, vereadora candidata à reeleição pelo PSOL

Elaine Mineiro, vereadora candidata à reeleição pelo PSOL

Vereadora de São Paulo com a Mandata Coletiva Quilombo Periférico, grupo focado em defender pautas do movimento negro e periférico na câmara municipal, Elaine também concorre a mais um mandato na coligação que tem Guilherme Boulos (PSOL) como candidato a prefeito.

Elaine traz a experiência como legisladora para apontar o que deveria ser prioridade na segurança.

“Você tem GCMs que deveriam defender os Centros de Defesa da Mulher ou os CCAs – que são equipamentos de contraturno escolar para crianças frequentarem, mas você tem várias ocorrências dentro desses equipamentos noa territórioa e não há GCMs para protegê-los”, continua a vereadora de 40 anos.

Problemas com a violência e ataques a esses equipamentos públicos são comuns, assim como a falta de efetivo de segurança pública, focados em defender o patrimônio estatal no Centro.

“Esses equipamentos deveriam ter garantia de proteção. O que impede um homem que é violento, que sabe que a mulher está sendo atendida naquele serviço, de ir naquele serviço e tentar ser violento mais uma vez?”, completa Elaine.

Mais armas?

Só neste ano de 2024, a prefeitura gastou – ou investiu –  R$478.451,96 em 41 novos fuzis para a Guarda Metropolitana, triplicando o que foi gasto em 2021, quando adquiriu 11 fuzis por R$128.365,16. Mas o investimento em armas gera dúvidas.

Jussara Basso (PSB) é totalmente contra a ideia do armamento, assim como Elaine Mineiro (PSOL). Já Emerson defende um armamento maior para a GCM, mas acha que isso tem que ser feito junto do que chama de “letramento racial”.

Emerson Rosa, candidato a vereador pelo Novo

Emerson Rosa, candidato a vereador pelo Novo

“O projeto do Partido Novo é de endurecimento 100% em relação à segurança pública. Ou seja, aumentar o efetivo da polícia e o armamento. Mas eu entendo que, pra mim, seria um apoio ao armamento desde que haja uma conscientização conjunta”, acredita o candidato do Novo.

“Com um investimento em grande proporção em termos de letramento racial, você evitaria, por exemplo, a discriminação do jovem negro e periférico, da polícia taxá-lo como um criminoso”, completa o advogado.

Nesse ponto, Jussara concorda que a GCM  precisa de mais educação e adiciona mais atenção psicológica na discussão.

“O treinamento de atuação do GCM é um treinamento prático. A gente precisa começar a abordar outras questões”, diz Jussara, se referindo às dificuldades mentais que agentes de segurança vivenciam na profissão.

“Essas pessoas vivem num ambiente extremamente insalubre e opressor. Eles são colocados à prova o tempo todo e não são bem remunerados ou valorizados. Temos que aplicar em seu treinamento um conhecimento da região onde ele vai atuar e das pessoas que ele vai conviver”, completa Jussara.

O medo que um jovem negro sente ao ver as luzes do giroflex se aproximar não vai terminar até que investimentos nessas “outras questões” citadas por Jussara sejam feitos.

“A gente tem um projeto de lei aprovado aqui na Câmara Municipal que fala sobre como você cria dentro da cidade espaços de sociabilização para esses jovens conseguirem construir e fortalecer vínculo com a família”, observa Elaine Mineiro.

Elaine fala sobre um discurso que não gera resultados e é usado por políticos sobre a segurança pública.

“O que a gente observa é que não tem uma ligação direta entre o aumento de policiamento e a diminuição da violência”, conta Elaine. “Você não precisa fazer nenhum gesto que aponte uma melhora da política pública. Só [adotar] o discurso mais duro, o discurso mais pesado já convence as pessoas de que você está fazendo alguma coisa”.

Enquanto a Prefeitura gasta com armamento, políticas de “limpeza” e remoção de cracolândias espalhadas nas regiões centrais de São Paulo, o problema real permanece. Para Emerson, falta cobrar.

“Se o Estado tem tomado a providência de endurecer mais a segurança pública, que haja, consequentemente, um investimento no sentido de conscientizar as pessoas”, opina o advogado.

Convergência?

Ao se discutir política nos últimos anos, a polarização de opiniões, candidaturas e ideologias alimentam a desesperança de quem mora no País. Mas a política também é o caminho para conquistar direitos – onde também há uma polarização entre quem tem acesso e quem não tem.

Jussara Basso, vereadora candidata à reeleição pelo PSB

Jussara Basso, vereadora candidata à reeleição pelo PSB

“Quando você chega nos extremos, em regiões fronteiriças com outras cidades, você percebe que a ausência do Estado é total. Falta saneamento, falta regularização fundiária, falta iluminação, falta saúde, educação, enfim, as pessoas estão abandonadas”, ressalta Jussara.

A inação do Estado nesses lugares – periferias, extremos, áreas rurais – é regra em todo o município.

Segundo a própria Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento (SMUL), cerca de 5,3% da cidade de São Paulo ainda vive sem saneamento básico. Pode não parecer muito, mas esses 5% representam cerca de 660 mil pessoas, e o número pode ser ainda maior.

“É tudo um elo, certo? Quando você tem a falta de saneamento básico, você tem o aumento do contágio de doenças, infectos com drogas, doenças virais…E aí você sobrecarrega o sistema público de saúde… Com isso, os problemas vão se amontoando”, diz Emerson, do Novo.

O candidato exemplifica o que viu em uma visita ao bairro de Vargem Grande, na região de Parelheiros. “Imagina para se ter acesso a um hospital público, uma escola, base policial, posto de saúde, farmácia, mercados, banco… É um bairro praticamente isolado. E dentro desse bairro foram-se suprindo essas necessidades”, narra.

Apesar das discordâncias, Jussara quer buscar convergências em questões para a população das quebradas.

“Eu ficaria muito feliz se a gente tivesse uma bancada periférica realmente representativa dentro daquela casa (…) No final das contas, o que a gente quer é mobilidade, o que a gente quer é moradia digna, iluminação, saúde, a gente quer as mesmas coisas. E isso são os pontos de convergência. Vamos focar neles”, termina a candidata.

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