Não deu para Guilherme Boulos (PSOL), de novo. Em sua segunda disputa à Prefeitura de São Paulo, o deputado federal oriundo do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) foi novamente derrotado por uma candidatura da direita: dessa vez, para o atual prefeito Ricardo Nunes (MDB), que venceu a disputa com 3,3 milhões de votos (59,36% dos votos válidos) contra 2,3 milhões do oponente de esquerda (40,64%).
O resultado repete um padrão observado na eleição de 2020, em meio à pandemia de covid-19, quando Boulos perdeu a disputa para Bruno Covas (PSDB) praticamente com o mesmo percentual de votos.
Mas outro número chama a atenção: o de quem não votou em ninguém ou sequer foi à seção eleitoral.
A cidade de São Paulo tem mais de 9,4 milhões de pessoas aptas a votar. Desse total, 2,9 milhões não foram votar (31,5% do eleitorado). E mais de 664 mil pessoas (11% dos votos totais) votaram em branco ou nulo. Ao todo, foram 5,7 milhões de votos válidos, quase 400 mil a menos que no primeiro turno.
“Existe uma profunda descrença com o sistema eleitoral e que expressa a fragilidade da nossa democracia”, aponta Tiaraju Pablo D’Andrea, que coordena o Centro de Estudos Periféricos (CEP) na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) da zona Leste.
Para o professor e pesquisador, outros fatores contribuem para essa fragilidade: desde os ataques de Pablo Marçal (PRTB) sem respostas contundentes das autoridades, a acusação sem provas feita pelo governador Tarcísio (Republicanos) no dia da eleição até a falta de ênfase no escândalos de Nunes, como a máfia das creches, as obras sem licitação ou a infiltração do crime organizado na Prefeitura.
“E tem o uso de emendas parlamentares, que vêm de deputados federais e vai se capilarizando em várias quebradas. Isso é a reatualização da república velha brasileira, do coronelismo, e demonstra que a democracia avançou pouco porque algumas fórmulas continuam se reproduzindo ao longo do tempo”, continua Tiaraju.
O que os números apontam?
Boulos ganhou apenas no Piraporinha (51,68%) e Valo Velho (51,6%), além da Bela Vista (55,24%), que fica no Centro da cidade.
Já Nunes venceu em 54 das 57 zonas eleitorais, mas com percentuais diferentes. As maiores votações aconteceram em bairros ricos e de classe média alta, como Indianópolis (69,78%), onde registrou sua maior votação. Também foi muito bem votado na Mooca (68,15%), Santo Amaro (67,82%), Santana (67,03%), Jardim Paulista (65%).
Se Boulos venceu em 14 periferias paulistanas no primeiro turno, ele aumentou a votação nesta rodada. Mas na maioria delas ficou atrás de Nunes, que repetiu o bom desempenho no Pedreira (62,54%), Cidade Ademar (60,48%) ou Lauzane Paulista (64,9%).
“Se conflagrou em São Paulo um anel suburbano em volta do Centro que é conservador, e que Nunes teve mais votos. Depois, nas periferias em transição, tem uma variação com Nunes na frente, mas varia em diferença. Na Cidade Tiradentes, por exemplo, Nunes ganhou por 1%, o que é muito pouco. No Campo Limpo (51,3% para Nunes) e Capão Redondo (51,6%), também foi pouca diferença” – Tiaraju
Em outras quebradas, as diferenças também variam. Nunes venceu no Extremo Sul, como o Grajaú (54,73%), onde teve margem apertada no primeiro turno; em Parelheiros, ficou com 56,44%.
Também recuperou terreno em Perus (56,72% dos votos) e na Brasilândia (58,55%).
Na zona Leste, obteve votação expressiva no Cangaíba (62,29%). Também ganhou em São Miguel Paulista (59,55%); Itaim Paulista (58,23%); Itaquera (58,22%); Jardim Helena (57,74%); Cohab José Bonifácio (55,45%); Guaianases (55,19%); São Mateus (53,33%).
Para Tiaraju, os números não podem desanimar o campo progressista, já que o resultado geral repete 2020. É preciso olhar além do mapa.
“Não dá pra dizer que periferia ficou mais à direita, só mudaram alguns distritos”, diz ele, que também nota uma migração em massa de quem votou em Marçal no primeiro turno para o candidato oficial do bolsonarismo.
“Isso mostra que tem uma direita e uma centro-direita que fecham junto, e a esquerda bate no teto de 40% dos votos válidos, o que é importante reter neste momento”, completa Tiaraju.
Thiago Borges