Entrevista de Laís Diogo. Texto de Thiago Borges
Para a cantora e empreendedora Margareth Menezes, que ocupa o cargo de ministra da Cultura no terceiro mandato do Presidente Lula (PT), os governos estaduais podem adotar critérios próprios para selecionar projetos que serão contemplados pela Lei Paulo Gustavo, desde que cumpram o que a legislação prevê.
A afirmação foi feita na última sexta-feira (15/9), em entrevista coletiva realizada pelo Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé com a participação de jornalistas de veículos independentes. A pergunta foi feita por Laís Diogo, comunicadora da Periferia em Movimento, que participou do encontro virtual (assista abaixo), após movimentos culturais paulistas lançarem uma petição solicitando que o Ministério da Cultura intervenha na aplicação da Lei Paulo Gustavo no Estado de São Paulo, governado pelo bolsonarista Tarcísio de Freitas (Republicanos).
“A lei emergencial obedece, na sua execução, uma série de coisas que estão estabilizadas no decreto (…) Os estados têm a responsabilidade de fazer essa execução (…) O Ministério da Cultura age no sentido de analisar até onde o gestor estadual está dentro, quais são os limites em relação à maneira como está executando, mas cada estado tem alguma autonomia, se essa autonomia não ferir a lei”, diz Margareth.
Direito à cultura
A Lei Paulo Gustavo (LPG) foi elaborada por agentes culturais no ano de 2021 e aprovada em 2022 com amplo apoio da sociedade civil, de gestores públicos de cultura e de parlamentares dentro do Congresso Nacional. A exemplo da Lei Aldir Blanc de 2020 (LAB 1), trata-se de uma lei emergencial que dispõe sobre “ações emergenciais destinadas ao setor cultural a serem adotadas em decorrência dos efeitos econômicos e sociais da pandemia da covid-19”.
O Fórum Litoral, Interior e Grande São Paulo (FLIG) aponta que, no Estado de São Paulo, a Secretaria da Cultura, Economia e Indústrias Criativas e do Governo do Estado de São Paulo tem descumprido a lei. O grupo aponta que, em 2020, a LAB 1 disponibilizou R$ 264 milhões e contemplou mais de 7 mil iniciativas. Agora, apesar da LPG aumentar os recursos para R$ 350 milhões, os editais lançados pelo governo de Tarcísio devem contemplar um total de 900 projetos.
Os editais da LPG em São Paulo, por sua vez, contemplam um número previsto de 900 projetos no Estado como um todo, o que representa uma redução de 677,7% no número de contemplados. As contas pioram ainda mais quando notamos que, enquanto o número de projetos contemplados diminui vertiginosamente, o recurso aumentou: passou de R$ 264 milhões para mais de R$ 350 milhões, o que representa um aumento de quase R$ 100 milhões – equivalente a todo o valor dos editais anuais do ProAC.
“Os editais da LPG em São Paulo, assim, privilegiam grandes produções e propõem a concentração desses recursos. Enquanto a LAB 1 tinha uma média de R$ 37 mil reais por projeto e o ProAC 2023 possui um valor médio de R$ 102 mil, os editais da LPG no Estado concentram uma média de R$ 389 mil reais, quase 4 vezes mais do que o ProAC e mais de 10 vezes do que a LAB 1”, diz a petição. Clique aqui para ler na íntegra e assinar.
Além de limitar o número de projetos contemplados, o governo paulista adiciona uma série de restrições a concorrentes, como a premiação de projetos inscritos por pessoas jurídicas em detrimento de pessoas físicas. E todos os editais exigem ao menos 5 anos de CNPJ dessas iniciativas, diferente do padrão de 2 anos adotado pela Secretaria em outras linhas de fomento, o que pode inviabilizar a participaçãp de agentes culturais de periferias.
“O Governo do Estado de São Paulo desconsidera todas as pessoas que, durante os últimos anos, saíram de um trabalho cultural na informalidade, abriram suas empresas ou associações, e passaram a atuar na formalidade. Essa mudança é, no mínimo, questionável do ponto de vista jurídico”, diz o texto.
Outro ponto é o tempo reduzido para se inscrever, cerca de 71% menor que os estabelecidos pelo Proac. As inscrições para os editais da LPG em São Paulo terminam neste mês. Confira aqui.
Descentralização
Ainda na entrevista, a ministra Margareth Menezes reforçou que é provável que nem todes agentes culturais vão conseguir acessar as políticas públicas do setor neste momento, ainda que o governo federal esteja observando o cumprimento da lei emergencial, que teve adesão de 98% dos municípios brasileiros. Por outro lado, reforçou que o Ministério da Cultura está com um orçamento recorde para este ano, com R$ 10 bilhões, e que o objetivo da gestão é descentralizar recursos – o setor responde por 3,1% das riquezas produzidas no País.
“O Plano Nacional de Cultura que vai irrigar em cada cidade mais R$ 3 bilhões a partir desse ano durante 5 anos, então nós estamos agora realmente fazer esse exercício começando esse sistema de descentralização”, diz a ministra.
No encontro, Margareth Menezes também destacou a retomada de programas como o Cultura Viva e de obras do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) para a construção de equipamentos culturais em todo o País, em especial em periferias e favelas. “A cultura certamente é uma um dispositivo de emancipação e de transformação social. A arte traz isso, né?”
Redação PEM, Laís Diogo, Thiago Borges