Sábado, 19 de outubro de 2013.
Sergio Vaz está ansioso.
A poucos minutos da abertura da sexta Mostra Cultural da Cooperifa, o auditório do CEU Casa Blanca ainda está vazio.
Porém, os 450 assentos disponíveis foram tomados pelo público e algumas pessoas tiveram de se acomodar pelos degraus.
“Tudo isso é para a comunidade. Se essas pessoas não estivessem aqui, seria como um céu sem estrelas. E hoje nosso céu tá estrelado”, diz Vaz.
Criada por Vaz e outros agitadores culturais em 2001, em um bar de Taboão da Serra, a Cooperifa – Cooperativa Cultural da Periferia celebra 12 anos de resistência poética na periferia paulistana.
Presente desde os primeiros saraus realizados no bar do Português, Rose Dórea é exemplo de transformação promovida pela Cooperifa.
“Voltei a estudar por conta da Cooperifa, me tornei uma pessoa mais flexível e, em um país cujo padrão de beleza é a mulher magra e branca, me tornei a “Musa da Cooperifa” sendo negra e gorda. Então, tudo muda por completa (risos)”, ressalta Rose.
Para além da própria vida, Rose nota um número maior de leitores e um novo olhar sobre as periferias. “As coisas mudam quando as pessoas acreditam. E a gente acredita de verdade no projeto”, diz.
Outra poeta fiel, a cantora Kelly acompanha a Cooperifa há 11 anos, desde que entrou para o grupo de rap Versão Popular – que tem a mesma idade do projeto literário.
“Nossas músicas eram muito ‘criminais’. Na Cooperifa, vimos que tinha outras coisas interessantes para falar, como o menino jogando bola, a nossa cultura, etc. Abriu a nossa mente”, diz Kelly.
Para a estilista Luciana Silva, que conheceu o movimento há cinco anos, a Cooperifa é um lugar dos sonhos. Amante das artes, desde então ela frequenta os saraus todas as semanas e se tornou figurinha carimbada nas noites de poesia.
Além de encontrar amigos que se interessam por cultura e trabalhos sociais, como a distribuição de livros no Natal e os eventos realizados na Fundação Casa, Luciana teve a oportunidade de viajar recentemente para a Alemanha, onde acompanhou Vaz em debates sobre literatura periférica na Embaixada Brasileira em Berlim e no grupo estudos luso-brasileiros da Universidade de Colônia.
“Tudo isso é fruto de muito amor pela comunidade”, diz ela.
Primavera periférica
Sob a lua cheia, os sons ecoam do CEU Casa Blanca.
Influenciada por samba, jongo, batuque de umbigada e os bailes black, a banda Aláfia abriu a Mostra Cultural da Cooperifa de 2013 levantando o público com a junção da música negra com uso de instrumentos de percussão, metais, guitarra, violão e vocais. Para ouvir as músicas da banda,clique aqui.
A noite foi encerrada pelo Poesia Samba Soul, com 25 anos de caminhada na música e em projetos sociais que envolvem áudio, vídeo e energias renováveis.
“Antes, reinava a criminalidade, a violência. Como nós, a Cooperifa, o Sansacroma, entre outros coletivos, começaram a mudar essa situação pela cultura”, diz Fabio Miranda, baixista da banda. “A cultura periférica é ferramenta de transformação, pois coloca as pessoas para pensar”.
Originário do Jardim Ângela, o grupo de samba e soul music atua em na região que foi considerada a mais perigosa do mundo nos anos 90.
Ao lado de Capão Redondo e Jardim São Luís, o Jardim Ângela formava o chamado de “triângulo da morte”.
No centro desse triângulo, desde 2004 acontecem os saraus da Cooperifa. Em torno desse local – o bar do Zé Batidão –, milhares de artistas e moradores devem circular até o dia 27 de outubro, quando ocorre o encerramento da Mostra Cultural.
“A gente está vivendo nossa primavera periférica ao assumir o protagonismo da cultura, que não é só fazer cultura mas consumir cultura”, diz Vaz, que espera estar no mesmo lugar e fazendo as mesmas coisas (talvez de um jeito diferente) pelos próximos 12 anos.
“A Cooperifa não tem como crescer fisicamente, só espiritualmente”.
CONFIRA FOTOS DA MOSTRA CULTURAL DA COOPERIFA
Créditos das fotos: Aline Rodrigues, Joseh Silva, Paula Lopes Menezes, Thais Abade e Thiago Borges
Thiago Borges