Clima extremo, renda incerta: Chuvas e calor além do normal atrapalham informais nas ruas

Clima extremo, renda incerta: Chuvas e calor além do normal atrapalham informais nas ruas

Motoboys e catadoras estão em movimento, mas paralisam com os impactos na saúde ou as perdas causadas por tempestades. Conheça as histórias que contamos na segunda reportagem da série Trampo é Trampo em 2025!

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Tempo de leitura: 8 minutos

Reportagem de Vitori Jumapili com fotos de Pedro Salvador. Revisão: Thiago Borges

As mudanças climáticas representam um risco crescente para a saúde e segurança de mais de  70% de pessoas trabalhadoras em todo o mundo, segundo estudo da Organização Internacional do Trabalho (OIT) divulgado em 2020. 

A vulnerabilidade se intensifica no cotidiano de quem trabalha na informalidade e em movimento pelas ruas da cidade. Profissionais como motoboys e catadoras de recicláveis enfrentam o calor extremo e chuvas intensas, criam estratégias para se adaptar ao novo cenário, que impacta na renda mensal.

As mudanças climáticas escancaram a instabilidade financeira e as condições precárias de trabalho para quem está na ponta da cadeia produtiva, sem o suporte adequado para lidar com a situação.

É o caso de Cida Preta e Alisson Domingues, que têm as histórias contadas aqui!


Confira a segunda reportagem da série Trampo é Trampo da Periferia em Movimento em 2025.

Quando chove, não compensa

Maria Aparecida Rodrigues, de 71 anos, é catadora de recicláveis há 30 anos e ficou conhecida como Cida Preta.

Há cinco anos, ela criou a Cooperativa de Materiais Recicláveis Cida Preta, que está em processo de regularização jurídica. A sede provisória funciona na casa dela, no Jardim Lucélia (Extremo Sul da cidade de São Paulo) 

Hoje, Cida emprega 10 mulheres entre 40 e 60 anos, que trabalham em dias alternados, já que a estrutura da casa não comporta tanta gente junto aos materiais.

O grupo também precisa se adaptar à intensificação dos eventos extremos, como as fortes temperaturas, as mudanças repentinas no tempo e torós incomuns. Para diminuírem o impacto já notado, as cooperadas têm criado estratégias.

É o caso das irmãs Raimunda, 63, e Rosa Prates, 53, também moradoras do Jardim Lucélia. As catadoras trabalham de segunda a sexta, das 7h às 11h manhã, parte do dia em que a radiação solar é menos acentuada. Mas quando chove, elas nem saem para a catação, nem Cida abre a cooperativa  porque o material coletado pode ser comprometido com a água.

“Quanto tá chovendo a gente nem vai, porque molha tudo, né? Aí não compensa”, diz Raimunda.

“A gente pega [as caixas de papelão] da padaria ali, e se chover muito não dá para pegar, porque molha e não dá para secar depois”, completa Rosa.

Sem cobertura suficiente, em dias de chuva forte a triagem não acontece também, porque não há como proteger os materiais.

“Até o dia que tivermos um galpão, se não tiver chovendo nós estamos aqui, se tiver chovendo nós não estamos  (…) Hoje o calor está muito mais intenso e você não sabe quando vem a chuva e quando tá chovendo mesmo, não dá [para trabalhar] ”, diz Cida

Por receberem por dia, a depender da quantidade de dias que elas ficam impossibilitadas de trabalhar, o valor recebido no final do mês pode variar muito.  Além disso, as cooperadas precisam atingir uma meta de quilos por materiais coletados para conseguir vender os recicláveis mês a mês.

Faça chuva ou faça sol, preciso trampar

Alisson Domingues de Oliveira tem 30 anos e é morador da Vila da Paz, bairro periférico na região de Interlagos (zona Sul). Há 8 anos, ele trabalha como motoboy. 

Hoje, ele divide 12 horas diárias de trabalho entre um emprego no regime CLT e as entregas por aplicativo que faz por conta.

O motoboy sente intensamente o ar seco, as chuvas repentinas e mudanças bruscas de tempo no trânsito de São Paulo. Garganta arranhando e dificuldades respiratórias são notadas em dias mais secos. Nos dias chuvosos, ele pode passar horas com as roupas molhadas.

“A capa é uma proteção que não suporta um dia na moto. Eu fico umas cinco horas na rua direto,na chuva mesmo, sem parar. Pode ser a melhor capa, mas vai molhar…”, diz Alisson.

Quando é surpreendido por enchentes e alagamentos, o trabalho dele é afetado diretamente. Nessas situações, Alisson sempre procura por locais fora de perigo – como embaixo de pontes, e interrompe as entregas se necessário.

“A entrega tá coberta, protegida, não tá sendo molhada… Agora, o motoboy é que está na situação mais crítica”.

Em situações assim, Alisson já atrasou entregas e perdeu a conta de prestação de serviço de alguns aplicativos, como o iFood, o que diminui as opções de empresas a quem trabalha e, consequentemente, os ganhos dele

Segundo um levantamento de 2020 da UFBA (Universidade Federal da Bahia) sobre o trabalho com entregas por aplicativos no Brasil, os bloqueios são frequentes: 38,8% das pessoas entrevistadas pela pesquisa já foram bloqueadas pelas empresas detentoras da tecnologia.

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Reportagem de Vitori Jumapili com fotos de Pedro Salvador. Revisão: Thiago Borges

As mudanças climáticas representam um risco crescente para a saúde e segurança de mais de  70% de pessoas trabalhadoras em todo o mundo, segundo estudo da Organização Internacional do Trabalho (OIT) divulgado em 2020. 

A vulnerabilidade se intensifica no cotidiano de quem trabalha na informalidade e em movimento pelas ruas da cidade. Profissionais como motoboys e catadoras de recicláveis enfrentam o calor extremo e chuvas intensas, criam estratégias para se adaptar ao novo cenário, que impacta na renda mensal.

As mudanças climáticas escancaram a instabilidade financeira e as condições precárias de trabalho para quem está na ponta da cadeia produtiva, sem o suporte adequado para lidar com a situação.

É o caso de Cida Preta e Alisson Domingues, que têm as histórias contadas aqui!


Confira a segunda reportagem da série Trampo é Trampo da Periferia em Movimento em 2025.

Quando chove, não compensa

Maria Aparecida Rodrigues, de 71 anos, é catadora de recicláveis há 30 anos e ficou conhecida como Cida Preta.

Há cinco anos, ela criou a Cooperativa de Materiais Recicláveis Cida Preta, que está em processo de regularização jurídica. A sede provisória funciona na casa dela, no Jardim Lucélia (Extremo Sul da cidade de São Paulo) 

Hoje, Cida emprega 10 mulheres entre 40 e 60 anos, que trabalham em dias alternados, já que a estrutura da casa não comporta tanta gente junto aos materiais.

O grupo também precisa se adaptar à intensificação dos eventos extremos, como as fortes temperaturas, as mudanças repentinas no tempo e torós incomuns. Para diminuírem o impacto já notado, as cooperadas têm criado estratégias.

É o caso das irmãs Raimunda, 63, e Rosa Prates, 53, também moradoras do Jardim Lucélia. As catadoras trabalham de segunda a sexta, das 7h às 11h manhã, parte do dia em que a radiação solar é menos acentuada. Mas quando chove, elas nem saem para a catação, nem Cida abre a cooperativa  porque o material coletado pode ser comprometido com a água.

“Quanto tá chovendo a gente nem vai, porque molha tudo, né? Aí não compensa”, diz Raimunda.

“A gente pega [as caixas de papelão] da padaria ali, e se chover muito não dá para pegar, porque molha e não dá para secar depois”, completa Rosa.

Sem cobertura suficiente, em dias de chuva forte a triagem não acontece também, porque não há como proteger os materiais.

“Até o dia que tivermos um galpão, se não tiver chovendo nós estamos aqui, se tiver chovendo nós não estamos  (…) Hoje o calor está muito mais intenso e você não sabe quando vem a chuva e quando tá chovendo mesmo, não dá [para trabalhar] ”, diz Cida

Por receberem por dia, a depender da quantidade de dias que elas ficam impossibilitadas de trabalhar, o valor recebido no final do mês pode variar muito.  Além disso, as cooperadas precisam atingir uma meta de quilos por materiais coletados para conseguir vender os recicláveis mês a mês.

Faça chuva ou faça sol, preciso trampar

Alisson Domingues de Oliveira tem 30 anos e é morador da Vila da Paz, bairro periférico na região de Interlagos (zona Sul). Há 8 anos, ele trabalha como motoboy. 

Hoje, ele divide 12 horas diárias de trabalho entre um emprego no regime CLT e as entregas por aplicativo que faz por conta.

O motoboy sente intensamente o ar seco, as chuvas repentinas e mudanças bruscas de tempo no trânsito de São Paulo. Garganta arranhando e dificuldades respiratórias são notadas em dias mais secos. Nos dias chuvosos, ele pode passar horas com as roupas molhadas.

“A capa é uma proteção que não suporta um dia na moto. Eu fico umas cinco horas na rua direto,na chuva mesmo, sem parar. Pode ser a melhor capa, mas vai molhar…”, diz Alisson.

Quando é surpreendido por enchentes e alagamentos, o trabalho dele é afetado diretamente. Nessas situações, Alisson sempre procura por locais fora de perigo – como embaixo de pontes, e interrompe as entregas se necessário.

“A entrega tá coberta, protegida, não tá sendo molhada… Agora, o motoboy é que está na situação mais crítica”.

Em situações assim, Alisson já atrasou entregas e perdeu a conta de prestação de serviço de alguns aplicativos, como o iFood, o que diminui as opções de empresas a quem trabalha e, consequentemente, os ganhos dele

Segundo um levantamento de 2020 da UFBA (Universidade Federal da Bahia) sobre o trabalho com entregas por aplicativos no Brasil, os bloqueios são frequentes: 38,8% das pessoas entrevistadas pela pesquisa já foram bloqueadas pelas empresas detentoras da tecnologia.

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