Famílias e movimentos sociais se mobilizam contra despejos de mais de meio milhão de pessoas

Famílias e movimentos sociais se mobilizam contra despejos de mais de meio milhão de pessoas

Cerca de 126 mil famílias podem perder a casa no Estado de São Paulo. A maioria é formada por pessoas negras e mulheres, além de crianças e pessoas idosas

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Tempo de leitura: 8 minutos

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Reportagem de André Santos, com fotos de Pedro Salvador. Edição de texto: Thiago Borges

“Eles dificultam tudo pra gente achando que não temos o que fazer, e não resolvem em nada nossos problemas. A gente está hoje aqui pra mostrar a força do povo e dizer que não vamos mais aceitar isso. Estamos cansados de sermos desrespeitados, a gente só quer ter o direito de morar”.

Com essa fala contundente, Eliane foi às ruas para protestar na última quarta-feira (11 de junho). Moradora do Jardim Ingá (zona Sul de São Paulo), ela se preocupa com a demora para efetivar a regularização fundiária de sua moradia.

Para além dessas promessas não cumpridas pelo poder público na área da habitação, há ainda as ameaças na outra ponta: os despejos estão em alta em São Paulo.

Com o fim da suspensão promovida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que revogou todas as desocupações durante o período da pandemia, os processos de reintegração de posse voltaram a acontecer de forma contundente e violenta.

De acordo com o levantamento realizado pela Campanha Despejo Zero, cerca de 126 mil famílias estão ameaçadas de despejo em todo o estado de São Paulo. Isso representa mais de meio milhão de pessoas nessa situação, das quais 334.152 são pessoas negras, 315.504 são mulheres, 86.184 são crianças e 84.682 são pessoas idosas. Ao todo, são 686 comunidades afetadas. E 12.865 famílias já foram despejadas.

Em resposta a isso, movimentos populares de moradia, organizações sociais e ativistas ocuparam as ruas do centro capital paulista para reivindicar o direito à moradia digna e o fim da violência policial, que tem agido com truculência em diversos territórios.

O mais notório dos casos recentes se deu na Favela do Moinho, na região central de São Paulo, mas outras ocupações têm sofrido com a incerteza e resistido aos ataques e avanços por parte do poder público.

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“A mobilização é uma resposta dos movimentos de luta por moradia, comunidades, favelas e ocupações à onda de despejos que a gente tem vivido no estado de São Paulo”, explica a professora Irene Maestro, doutora em Direitos Humanos e militante do movimento Luta Popular.

“O que a gente tem visto são remoções forçadas, seja em área pública ou privada, remoções administrativas, de pessoas em situação consideradas de risco, sem qualquer tipo de medida para enfrentar a situação de risco e garantir a permanência das pessoas, como no caso do Jardim Pantanal”, conta Irene.

De acordo com o levantamento, dentre os 686 casos de comunidades, ocupações e favelas afetadas por processos de remoção, pouco mais da metade concentra-se na cidade de São Paulo.

Outras cidades da região metropolitana da capital também aparecem com grande concentração de casos, como Guarulhos, Osasco, São Bernardo do Campo, Francisco Morato, Embu das Artes e outras. No interior do estado, Ribeirão Preto também apresenta uma grande concentração de casos, sendo o segundo município com o maior número de casos.

“Existe um plano arquitetado pelo Ricardo Nunes e pelo Tarcísio, principalmente, mas junto com os seus membros de governo, numa política bastante alinhada ao fascismo de atacar o povo pobre e trabalhador”, observa Victoria Magalhães, integrante do MLB – Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas, um dos coletivos participantes da manifestação.

Ela destaca que isso começa pela expulsão do povo da região central da cidade, um plano para passar o território para a especulação imobiliária.

“É um plano de entregar as áreas existentes na cidade para a construção de empreendimentos e fazer dinheiro em cima dos locais onde o povo mora, resiste e vive há anos”, avalia.

Violência policial

Irene conta que, para garantir que as remoções ocorram, a Polícia Militar de São Paulo e a Guarda Civil Metropolitana (GCM) têm empregado violência brutal em desocupações, incluindo despejos sem ordem judicial, invasão de domicílio, ameaças e coação a moradores, com uso de bombas e truculência excessiva.

“Com avanço dos interesses econômicos por trás da expulsão de pessoas, o poder público tem lançado mão do uso de uma brutal violência policial. Os despejos estão acontecendo de forma truculenta para fazer acontecer na força essas remoções sem observar os protocolos que o Conselho Nacional de Justiça estabeleceu para situações de despejos, além de expedientes de criminalização das comunidades, como a gente viu com muita força no caso da Favela do Moinho”, explica Irene.

Em resposta a isso, os movimentos organizaram-se para protocolar denúncias e entregar ofícios na Prefeitura de São Paulo, Secretaria de Segurança Pública do Estado, Ministério Público Estadual e no Tribunal de Justiça de São Paulo.

As principais reclamações eram direcionadas a Guilherme Derrite (PL), atual secretário de segurança pública do Estado, do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) e do prefeito Ricardo Nunes (MDB), que foram fortemente cobrados por políticas truculentas e higienistas.

Victoria avalia que o ato foi “bastante vitorioso”. Ela aponta que apesar das dificuldades, como a realização da manifestação em um dia útil no período da tarde, mais de 5.000 pessoas ocuparam as ruas do centro de São Paulo para deixar um claro recado aos atuais gestores da cidade e do estado: o movimento de luta por moradia está unificado.

“Se mexer com uma comunidade, vai mexer com todas. (…) Nós não vamos abaixar a cabeça, e o povo não vai abaixar a cabeça, vai ocupar a rua pelo direito de morar e contra a violência policial, em uma demonstração que não vamos aceitar nada disso e vamos resistir. Esse governo não vai ter chances contra o povo organizado pelo direito de viver minimamente”, finaliza.

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Reportagem de André Santos, com fotos de Pedro Salvador. Edição de texto: Thiago Borges

“Eles dificultam tudo pra gente achando que não temos o que fazer, e não resolvem em nada nossos problemas. A gente está hoje aqui pra mostrar a força do povo e dizer que não vamos mais aceitar isso. Estamos cansados de sermos desrespeitados, a gente só quer ter o direito de morar”.

Com essa fala contundente, Eliane foi às ruas para protestar na última quarta-feira (11 de junho). Moradora do Jardim Ingá (zona Sul de São Paulo), ela se preocupa com a demora para efetivar a regularização fundiária de sua moradia.

Para além dessas promessas não cumpridas pelo poder público na área da habitação, há ainda as ameaças na outra ponta: os despejos estão em alta em São Paulo.

Com o fim da suspensão promovida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que revogou todas as desocupações durante o período da pandemia, os processos de reintegração de posse voltaram a acontecer de forma contundente e violenta.

De acordo com o levantamento realizado pela Campanha Despejo Zero, cerca de 126 mil famílias estão ameaçadas de despejo em todo o estado de São Paulo. Isso representa mais de meio milhão de pessoas nessa situação, das quais 334.152 são pessoas negras, 315.504 são mulheres, 86.184 são crianças e 84.682 são pessoas idosas. Ao todo, são 686 comunidades afetadas. E 12.865 famílias já foram despejadas.

Em resposta a isso, movimentos populares de moradia, organizações sociais e ativistas ocuparam as ruas do centro capital paulista para reivindicar o direito à moradia digna e o fim da violência policial, que tem agido com truculência em diversos territórios.

O mais notório dos casos recentes se deu na Favela do Moinho, na região central de São Paulo, mas outras ocupações têm sofrido com a incerteza e resistido aos ataques e avanços por parte do poder público.

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“A mobilização é uma resposta dos movimentos de luta por moradia, comunidades, favelas e ocupações à onda de despejos que a gente tem vivido no estado de São Paulo”, explica a professora Irene Maestro, doutora em Direitos Humanos e militante do movimento Luta Popular.

“O que a gente tem visto são remoções forçadas, seja em área pública ou privada, remoções administrativas, de pessoas em situação consideradas de risco, sem qualquer tipo de medida para enfrentar a situação de risco e garantir a permanência das pessoas, como no caso do Jardim Pantanal”, conta Irene.

De acordo com o levantamento, dentre os 686 casos de comunidades, ocupações e favelas afetadas por processos de remoção, pouco mais da metade concentra-se na cidade de São Paulo.

Outras cidades da região metropolitana da capital também aparecem com grande concentração de casos, como Guarulhos, Osasco, São Bernardo do Campo, Francisco Morato, Embu das Artes e outras. No interior do estado, Ribeirão Preto também apresenta uma grande concentração de casos, sendo o segundo município com o maior número de casos.

“Existe um plano arquitetado pelo Ricardo Nunes e pelo Tarcísio, principalmente, mas junto com os seus membros de governo, numa política bastante alinhada ao fascismo de atacar o povo pobre e trabalhador”, observa Victoria Magalhães, integrante do MLB – Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas, um dos coletivos participantes da manifestação.

Ela destaca que isso começa pela expulsão do povo da região central da cidade, um plano para passar o território para a especulação imobiliária.

“É um plano de entregar as áreas existentes na cidade para a construção de empreendimentos e fazer dinheiro em cima dos locais onde o povo mora, resiste e vive há anos”, avalia.

Violência policial

Irene conta que, para garantir que as remoções ocorram, a Polícia Militar de São Paulo e a Guarda Civil Metropolitana (GCM) têm empregado violência brutal em desocupações, incluindo despejos sem ordem judicial, invasão de domicílio, ameaças e coação a moradores, com uso de bombas e truculência excessiva.

“Com avanço dos interesses econômicos por trás da expulsão de pessoas, o poder público tem lançado mão do uso de uma brutal violência policial. Os despejos estão acontecendo de forma truculenta para fazer acontecer na força essas remoções sem observar os protocolos que o Conselho Nacional de Justiça estabeleceu para situações de despejos, além de expedientes de criminalização das comunidades, como a gente viu com muita força no caso da Favela do Moinho”, explica Irene.

Em resposta a isso, os movimentos organizaram-se para protocolar denúncias e entregar ofícios na Prefeitura de São Paulo, Secretaria de Segurança Pública do Estado, Ministério Público Estadual e no Tribunal de Justiça de São Paulo.

As principais reclamações eram direcionadas a Guilherme Derrite (PL), atual secretário de segurança pública do Estado, do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) e do prefeito Ricardo Nunes (MDB), que foram fortemente cobrados por políticas truculentas e higienistas.

Victoria avalia que o ato foi “bastante vitorioso”. Ela aponta que apesar das dificuldades, como a realização da manifestação em um dia útil no período da tarde, mais de 5.000 pessoas ocuparam as ruas do centro de São Paulo para deixar um claro recado aos atuais gestores da cidade e do estado: o movimento de luta por moradia está unificado.

“Se mexer com uma comunidade, vai mexer com todas. (…) Nós não vamos abaixar a cabeça, e o povo não vai abaixar a cabeça, vai ocupar a rua pelo direito de morar e contra a violência policial, em uma demonstração que não vamos aceitar nada disso e vamos resistir. Esse governo não vai ter chances contra o povo organizado pelo direito de viver minimamente”, finaliza.

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