Entrevistas e roteiro de Vênuz Capel. Revisão: Thiago Borges. Captação, edição de imagens e finalização: Vitori Jumapili. Edição de áudio: Paulo Cruz. Design: Rafael Cristiano
“Minha iniciação foi o momento mais calmo da minha vida. Foi muito mágico. A maior certeza da minha vida”, aponta Gustavo Gomes, de 13 anos. O menino fala de suas experiências em um terreiro de candomblé, religião que pratica desde cedo.
O bàbálorisá Daniel de Òsógiyán afirma que “a casa de asé precisa ser antes de tudo um espaço acolhedor para as crianças”. Por isso, o terreiro deve ser confortável e lúdico para que elas possam frequentar. Afinal, as crianças representam a continuidade das casas de candomblé.
“A criança é a responsável pela minha imortalização enquanto sacerdote. Quando eu retornar à massa primordial, eu tenho certeza que eu tô semeando e plantando um monte de sementinhas, que garantirão a minha lembrança e que eu não morra”, observa Daniel, que é dirigente da Comunidade da Renovação Ilê Asé Òsógiyán. O terreiro localizado no Extremo Norte de São Paulo é frequentado por 13 crianças e adolescentes entre 2 e 15 anos de idade.
Porém, muitas famílias que cultuam orixás têm de lidar com agressões físicas e verbais, ações judiciais e até mesmo a perda da guarda de crianças e adolescentes.
Apesar de apenas 0,3% da população brasileira se declarar pertencente a uma religião de matriz africana, segundo o censo de 2010 do IBGE, os casos de racismo religioso contra praticantes do candomblé e outras fés representaram 65% das denúncias feitas em 2020 ao Disque 100 – serviço do governo federal para receber denúncias de violações de direitos humanos.
E mesmo que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) garanta a liberdade de crença, até conselhos tutelares foram acionados para “protegê-las” em ritos sagrados da religião.
“Nenhuma criança é obrigada a estar aqui, assim como eu acho que nenhuma criança deve ser obrigada a frequentar nenhuma religião. Mas é um caminho natural que as crianças que têm pais cristãos se tornam cristãos. Por que seria diferente com os pais de umbanda ou candomblé?”, questiona o Daniel.
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Dentro do candomblé, a feitura é entendida como uma gestação, em que cada praticante fica 21 dias recluso no terreiro e passa pelos atos da iniciação e preceitos. Na crença nagô, as pessoas nascem sempre na mesma família e a criança é entendida como um antepassado que retorna ao seio familiar. A iniciação é uma forma de valorizar a memória ancestral, uma viagem de devolução.
O racismo faz com que as pessoas questionem a iniciação de crianças como se fosse um fardo, ou algo pesado. Mas Ivan Camilo, de 14 anos, explica que não: “Aqui é o meu lugar, isso aqui é o que eu quero”.
Vênuz Capel, Vitori Jumapili, Thiago Borges, Paulo Cruz, Rafael Cristiano