Cooperativa Libertas tece alternativas de emancipaçao para mulheres sobreviventes do cárcere

Cooperativa Libertas tece alternativas de emancipaçao para mulheres sobreviventes do cárcere

Desde 2019, iniciativa desenvolve produtos e ações educativas para acolher, amparar, capacitar e emancipar egressas do sistema prisional

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Reportagem de Julia Vitoria. Edição: Thiago Borges. Artes: Rafael Cristiano

Absorventes ecológicos, ecopads, saquinhos reutilizáveis para grãos e sabonetes medicinais veganos. Com máquinas de costura e alguns materiais, desde 2019 a Cooperativa Libertas atua para acolher, amparar e capacitar profissionalmente mulheres sobreviventes do sistema prisional paulista em busca de autonomia financeira e emancipação social.

A iniciativa foi criada por Geralda Ávila, de 66 anos, que conhece de perto o cárcere. Nos anos 2000, ela visitava o ex-marido que estava preso na Casa de Detenção do Carandiru, em São Paulo, onde ocorreu o massacre de 111 presos há 30 anos. Moradora de Cotia (zona Oeste), nos dias de visita dona Geralda passava pelo Centro de Detenção Provisória (CDP) da Raposo Tavares, no KM 19 da rodovia.

“Via aquela fila imensa [da visita para os homens] e pensava: ‘quem tá preso lá?’. Aí eu descobri que tinham mulheres presas também. Eu pensei: ‘devem ser bem poucas’, mas não. Eram 1.200 mulheres, só que a fila de visitas delas tinha apenas 5 ou 10 pessoas, no máximo”, lembra.

O Brasil chegou a dezembro deste ano com mais de 892 mil pessoas privadas de liberdade, segundo o Banco Nacional de Monitoramento de Prisões (BNMP) do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Desse total, mais de 47 mil eram mulheres. Segundo o Instituto de Pesquisa de Política Criminal da Universidade de Londres, o País tem a terceira maior população carcerária do mundo.

Intrigada com a diferença de gênero até no cárcere, dona Geralda buscou informações, passou a atuar como voluntária da Pastoral Carcerária a partir de 2005 e começou a visitar e desenvolver atividades com mulheres privadas de liberdade. Ela também começou a acompanhar o cumprimento do benefício de saída temporária (as “saidinhas”) dessas mulheres. Foi nesse processo que idealizou uma cooperativa de trabalho e desenvolvimento social, que fundou com outras pessoas que conheceu no sistema.

“Primeiro a gente pensou em fazer uma oficina de costura a mão. E nessas conversas, a gente foi amadurecendo a ideia da cooperativa, porque a queixa principal das mulheres é: ‘o que é que eu vou fazer quando sair daqui?’. A gente via que não tinha oportunidade mesmo, porque a maioria das mulheres que estão presas são mães e, dentre essas mães, quase 100% são mães solo. São elas que cuidam dos filhos”, lembra Geralda.

 

Foi por meio de uma companheira que Viviane Gomes de Souza, 29, conheceu a LIbertas. “Ela falou que a dona Geralda estava precisando de uma pessoa para dar uma oficina de bordado”, conta Viviane, que viveu no cárcere por 5 anos. “Pra fim foi muito bom. Eu tive uma oportunidade aqui que nunca tive na minha vida. De tudo, eu faço um pouco. Eu bordo, eu costuro – e eu gosto. O bom disso é que eu gosto de fazer, é muito gratificante”, continua ela, que hoje é bordadeira, oficineira e responsável por vendas na cooperativa.

Frutos da Libertas

Além de dona Geralda e Viviane, a Cooperativa Libertas é formada por outras 6 mulheres: Marcita Assunção, designer, estilista e produção; Audrey Dorta, no financeiro, administrativo e projetos; Natália Domingos, na estamparia e organização de rodas de conversa; Anayde Paula, costureira e responsável pela produção; Talita Oliveira, arte educadora e oficineira;  Regina Pichuru, conselheira; e Silvana Helena, oficineira de bijuterias.

Mesmo com funções diferentes, todas fazem um pouco de tudo e o valor que sobra no caixa é dividido igualitariamente – cerca de 25% fica para a manutenção da cooperativa e 5% para a criação de um fundo semente para financiar cursos e ajuda de custo.

Atualmente, a principal fonte de recursos da Libertas são os editais. Mas a ideia é fortalecer a produção, que tem os absorventes ecológicos como carro-chefe. “Nós estamos tentando produzir um absorvente que seja descartável e biodegradável, contendo cera de carnaúba para fazer a parte impermeável, juntando um tipo de algodão que se chama flop, biodegradável”, explica dona Geralda, que quer disponibilizar os itens para mulheres que ainda estão encarceradas.

A cooperativa também tem uma casa de acolhidas para quem sai temporária ou definitivamente, mas não tem para onde ir. Viviane e outras 2 cooperadas moram na casa. “Algumas deixam de sair porque não têm um endereço para deixar lá [no presídio]. Então, nós levamos algumas coisas, distribuímos kits, fazemos vaquinha e damos dinheiro para a condução também de algumas. E a gente já avisa: ‘se você não tiver para onde ir, nós temos uma casa de acolhimento e você vai ser bem vinda lá”, conta dona Geralda.

A Periferia em Movimento esteve na cooperativa em novembro deste ano, contribuindo com uma oficina de produção de podcasts. Você pode acompanhar os trabalhos da Libertas pelo site e no instagram @cooperativalibertas.

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