Sob pressão das periferias, secretária Aline Torres vai a debate sobre terceirização de Casas de Cultura de SP

Sob pressão das periferias, secretária Aline Torres vai a debate sobre terceirização de Casas de Cultura de SP

Titular da pasta faltou às 9 audiências anteriores que discutiram a transferência da gestão de equipamentos públicos para organizações sociais. Há mais de 1 ano, agentes culturais resistem ao que chamam de “privatização”

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Reportagem de André Santos. Edição: Thiago Borges. Cobertura nas redes sociais: Vênuz Capel. Fotos: André Bueno/Rede Câmara

O Salão Nobre da Câmara Municipal de São Paulo ficou lotado de pessoas ligadas a movimentos culturais na manhã desta quinta-feira (9/3). Elas são contrárias à proposta de terceirização dos serviços das Casas de Cultura, que esteve em discussão na audiência pública de hoje.

Apesar de ter convocado o encontro, é a primeira vez que a secretária municipal de Cultura Aline Torres (MDB) comparece ao debate – essa foi a décima audiência chamada para tratar do assunto.

A treta vem desde o início do ano passado. Desde então, agentes culturais e diversas coletividades se organizaram no movimento SOS Casas de Cultura para defender que a gestão seja feita diretamente pelo poder público. Em dezembro de 2022, a Secretaria Municipal de Cultura (SMC) apresentou um edital para “gestão compartilhada” das Casas de Cultura.

Na proposta, a administração dos equipamentos sairia das mãos do poder público e seria feita por organizações da sociedade civil (OSCs), como já acontece nas áreas de saúde, assistência social e especificamente com as creches municipais.

“A insegurança em relação ao futuro pode ser dolorida, mas é um projeto eficaz. Alguns aqui citaram os problemas com as Fábricas de Cultura, mas problemas a gente tem dentro da nossa casa. Todo modelo pode ser ajustado”, disse Aline, durante a audiência pública,

As principais reivindicações de agentes e coletividades culturais são contra o sucateamento desses equipamentos públicos e em prol da abertura de novos concursos e editais públicos. Além disso, contestam o autoritarismo e falta de transparência acerca da implementação do edital, e cobram aumento do orçamento para a cultura, que corresponde a 0,7% do valor total da cidade.

Na audiência, Aline admitiu que as Casas de Cultura sofrem com faltas de equipe e de recursos, e que demandam de investimentos, mas ressaltou que só será possível consegui-los por meio das parcerias com a iniciativa privada. Além disso, garantiu que a versão final do edital será publicada e disponibilizada para consulta pública em breve, apesar da evidente discordância entre população e poder público.

Aline também citou que as OSCs não poderão fazer cobranças referentes ao uso dos espaços e que os serviços continuarão gratuitos. Ela também acusou agentes culturais de propagagem noticias falsas ao se referirem ao projeto como “privatização”.

Parlamentares com alinhamento à administração do prefeito Ricardo Nunes (MDB) compareceram, manifestaram apoio à Aline Torres, se desentenderam com o público presente, receberam vaias e se retiraram após suas falas. O destaque negativo foi do vereador de extrem-direita Rubinho Nunes (União Brasil), que fez falas transfóbicas e acusou agentes culturais de estarem fazendo campanha antecipada para o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL), pré-candidato as eleições municipais do ano que vem.

O que diz o movimento cultural

“Infelizmente, a secretária não conseguiu responder os diversos questionamentos feitos pela população durante a audiência. Por exemplo, ainda não sabemos por qual razão a SMC quer implementar esse modelo, que já se mostrou ineficiente, pouco transparente e autoritário, não levando em consideração uma característica fundamental das Casas de Cultura, que é exatamente o vínculo comunitário”, observa Gustavo Soares, agente cultural do coletivo Periferia Invisível e da Ocupação Cultural Mateus Santos, em Ermelino Matarazzo (zona Leste de São Paulo).

Gustavo cita os impasses envolvendo a gestão do Teatro Municipal, que é terceirizada e tem prejudicado profissionais que atuam no mais conhecido equipamento cultural da cidade; a troca de organização social responsável por gerir o programa Jovem Monitor Cultural, que forma centena de jovens para trabalhar na área; ou mesmo de escândalos envolvendo convênios em outros campos, como educação, saúde e assistência social.

“No mais, o que a SMC apresentou na audiência foi um atestado de incompetência e incapacidade de planejamento e gestão”, reforça Gustavo. “São problemas que não irão se resolver com a terceirização. Pelo contrário, serão aprofundados e agravados nesse modelo, já que não existe fiscalização por parte da Prefeitura”.

Criadas durante a gestão da ex-prefeita Luiza Erundina e implementadas pela então secretária da cultura Marilena Chauí no início dos anos 1990, as Casas de Cultura se consolidaram e espalharam-se pela cidade nos últimos 30 anos. Atualmente, São Paulo tem 20 unidades distribuídas por todas as regiões da capital, onde acontecem oficinas, apresentações musicais, teatrais e performances de forma gratuita.

Cidade em disputa

A possibilidade de terceirização das Casas de Cultura é mais um campo de disputa de diferentes visões de como a cidade deve ser administrada.

A audiência pública desta quinta foi predisida por Elaine Mineiro, da Mandata Quilombo Periférico (Psol) e Jair Tatto (PT), que são da oposição a Ricardo Nunes. A deputada federal Samia Bonfim (PSOL) também esteve presente, se manifestou contra a política de “estrangulamento orçamentário” desde a gestão de João Dória e colocou o mandato à disposição pra defender a pauta em esfera federal

Já Luna Zarattini (PT), suplente que irá assumir uma cadeira como vereadora na próxima semana, apontou que “a privatização não é só sobre a gratuidade, é sobre o caráter público. A gente tá defendendo aqui um debate para que as Casas de Cultura tenham uma participação popular e sejam de fato públicas. A gestão indireta vai atingir essa produção nas Casas de Cultura, que não terão a participação popular porque quem vai gerir esses espaços são empresas”, disse ela.

A futura parlamentar rebateu o argumento de que a proposta vai facilitar a manutenção dos equipamentos, como a compra ou conserto de uma porta que ficaria travado devido à necessida de licitação. “Para você consertar uma coisa de pequeno porte, não precisa de licitação. Isso é feito de forma direta. Pra você fazer licitação, é [para gastos] a partir de R$ 75 mil”, explica.

“O que gente tá ouvindo aqui é nitidamente o que o movimento de Cultura, o que gestores, o que as pessoas que estão nas casas de culturas querem. A gente quer é gestão direta, a gente quer conselho gestor e a gente quer que tenha concurso público. Porque, sem isso, não há Casa de Cultura. Isso vai esvaziar a cultura na nossa cidade”, completa.

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