Por Thiago Borges
Quase 70% das famílias não têm contato com seus entes queridos que estão encarcerados, desde início da pandemia. Para 54,1%, a saúde dos detentos é a principal preocupação. E 34% estão com dificuldade para conseguir manter a alimentação.
O impacto da pandemia de coronavírus no sistema prisional paulista extrapola os muros da detenção e atinge em cheio as famílias dos presos. É o que aponta um relatório feito pelo Núcleo de Estudos da Burocracia da Fundação Getúlio Vargas (NEB-FGV), em parceria com a Associação de Familiares e Amigos de Presos e Presas (AMPARAR).
O estudo também dados como a dependência pelas famílias do auxílio emergencial (em 44% das situações), a desconfiança da capacidade do advogado ou defensor público atuarem em favor dos detentos (74,5%) e a falta de qualquer suporte da Secretaria de Administração Penitenciária (96,6%). Cerca de 33,1% das pessoas ouvidas tiveram uma queda muito grande na renda nesse período, enquanto 26,5% ficaram sem qualquer rendimento.
Retrato da situação
Com mais de 225 pessoas em privação de liberdade, o Estado de São Paulo concentra 31% da população carcerária brasileira.
Para traçar um panorama da situação, o estudo entrevistou 1.283 familiares de pessoas presas em 126 das 150 unidades prisionais paulistas. 99% das entrevistadas eram mulheres, sendo 74% delas esposas ou companheiras e mais da metade (56,9%) pretas ou pardas. Entre os presos relacionados, 97% eram de homens e 3% de mulheres. Um a cada cinco deles ainda estavam em prisão provisória, ou seja, não tinham sido condenados.
“Em meio à pandemia, o sistema prisional é um dos locais onde o alastramento da doença se torna mais perigoso. Por serem espaços aglomerados de pessoas, com baixa ou nenhuma circulação de ar e um precário atendimento de saúde, as unidades prisionais já apresentam uma taxa de infecção e letalidade decorrente da covid-19 [que é] 5 vezes maior do que se observa no restante do país”, aponta o relatório.
Em junho, a Periferia em Movimento publicou uma reportagem com relatos enviados por presos a suas famílias por meio de cartas. Nos depoimentos, eles relatam medo, preocupação e falta de informação nas celas. “Ore por mim, pois estou desde ontem com dor em todo corpo, febre, dor no peito, dificuldade para respirar, sem paladar e sem olfato. É preocupante, pois quase metade da cela está com esses sintomas”, dizia um detento.
Encaminhamentos
O relatório aponta possíveis encaminhamentos para resolução desses problemas, como:
– Cumprimento da Recomendação 62/2020 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a qual, dentre outras orientações, sugere a reavaliação das prisões provisórias e a máxima excepcionalidade de novas ordens de prisão preventiva
– Priorização da saúde como pilar estruturante do serviço prestado pelo Estado no sistema prisional
– Inclusão de uma refeição noturna no cardápio das unidades prisionais, a m de garantir a segurança alimentar dos presos durante a pandemia;
– Controle e divulgação transparente dos dados sobre contaminações e mortes por covid-19 nas unidades prisionais do Estado;
– Estruturação de meios de contato direto entre as pessoas presas e suas famílias, tais como a instalação de telefones públicos ou tablets, como também o fortalecimento da atuação das assistentes sociais das unidades;
– Aplicação de recursos por parte da Secretaria de Administração Penitenciária (SAP) para a proteção social dos familiares de pessoas presas. Dentre as ações possíveis, criar um auxílio emergencial específico para familiares de pessoas presas e egressas.
Redação PEM