Por Marcelo Lino Jr. Edição: Hysa Conrado.
Foi belíssima a tarde de sábado (30) no Estádio do Pacaembu, em São Paulo. Céu azul, calor e festa popular, dia perfeito para a final da Taça das Favelas – mesmo que a partida tenha sido disputada lá no centro, com prédios de luxo e mansões em seu horizonte.
Uniformizadas, pessoas de quebradas diferentes usavam camisas parecidas, gritavam parecido e se divertiam ali, como iguais na alegria e na torcida pelos times do coração que representavam a Favela da 13 e a Vila São José.
Desde às 7h da manhã, apaixonados por futebol saíram de periferias diversas e tomaram as ruas da região central: Guarulhos, Vila São José, Brasilândia, Cidade Tiradentes, Jardim Brasil, Brooklin, Perí, Ermelino Matarazzo.

Final da Taça das Favelas no Pacaembu./Crédito: Marcelo Lino Jr.
As alamedas requintadas do bairro nobre recebiam o som dos batuques, a fumaça dos sinalizadores, o estouro dos fogos, o calor humano, enfim, a alegria embalada pela liberdade.
E o jogo nem tinha começado.
Dentro do estádio, descia para as arquibancadas um marmanjo bem alto, forte, de uns 60 anos. O cabelo grisalho, a bochecha vermelha queimada de sol e os olhos fechados emolduravam o ar de triunfo: seu time chegou à final. Aliás, não apenas o seu, mas o time da quebrada.
Atrás dele, um garoto magrelo, com seus sete anos, cabelo de gel e óculos “Juliet” nem ligava para o sol. No rosto, a expectativa ao gritar de emoção: É TREZE! Ao seu lado, o pai, com a faixa da torcida na mão, entregava aquilo que se chama imagem e semelhança. Era difícil perceber quem estava mais feliz.
Festa que emociona
Em Guarulhos, os bairros ao redor do aeroporto têm à vista as viagens internacionais. A proximidade dos aviões do mundo todo para as casas e barracos dá a sensação de grandeza e, ao mesmo tempo, a dimensão do que é pequeno.
Nos becos da Favela da 13, há alguns minutos do maior aeroporto internacional do Brasil, a diferença do asfalto novo e bem sinalizado para o esburacado e estreito está nos metros de distância que separam um “bairro” de uma favela.
Córregos mal tratados, campo de várzea tinindo. Iluminação deficiente, palco de show montado. A rua que só é rua nos registros da prefeitura, mas é beco para os moradores, visitantes e perdidos que ali passam, não cabe muitos carros, mas acomoda muita gente.
Do beco partem os jogadores e a torcida para o estádio. Eu não sei se eles pensam no jogo. Me pergunto se pensam nos 11 titulares, nas estatísticas, na probabilidade de vitória, em como será o gol, o jogo. Como apaixonado por futebol, desde pequeno eu sinto o que eles sentem. E não sei o que é.

Torcida da Favela da 13./Crédito: Marcelo Lino Jr.
Por que corremos na rua atrás da bola? Por que usamos camisas de time o tempo todo? Por que acordamos cedo, ansiosos por um jogo? Pior, por que acordamos cedo ansioso por um jogo que nem vamos jogar?
Desde muito cedo conhecemos o êxtase de uma partida. Assistimos, jogamos, sentimos a vibração. Muito cedo percebemos, através do futebol, que o mundo é absurdo.
Viramos adultos antes do tempo, para o bem ou para o mal, a cobrança no futebol vem cedo: para chutar bem, para ser rápido, para tocar melhor, para ser mais forte, mais ágil, para não perder aquela bola, para não perder aquele gol, aquele jogo… Para não chorar.
E aí crescemos. E a paixão pode até continuar, ora discreta, ora esfuziante como na partida final da Taça das Favelas.
O futebol de verdade se vive na várzea, onde estão sinalizadores e torcedores que vibram por seus times de coração, que representam verdadeiramente sua quebrada e seu corre – não aqueles das propagandas milionárias.
Quando o juiz apitou o final do jogo no Pacaembu e decretou o título da Favela da 13, o choro daquele garotinho de “Juliet” e daquele marmanjo com a cara queimada me fizeram pensar que complicamos demais as coisas.
No final, o futebol serve para aquilo mesmo: sentir orgulho, raiva, desespero, alegria, emoção, exaltação. Enfim, sentimentos que embalam os momentos mais marcantes da nossa vida.