“No rap, finco minha relação com a palavra”, diz Rico Dalasam, que se lança na literatura

“No rap, finco minha relação com a palavra”, diz Rico Dalasam, que se lança na literatura

Rapper diz que não quer disputar espaço com a trajetória de outros homens pretos na cena, amplia possibilidades artísticas com resgate de memórias da infância em álbum, podcast e primeiro livro

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Tempo de leitura: 5 minutos

Rico Dalasam iniciou novembro vivendo uma experiência artística nova em sua vida: nas artes visuais.

No primeiro domingo deste mês (3/11), o rapper de Taboão da Serra falou sobre imagens ausentes na orfandade e processo de amadurecimento de meninos negros. Ele participou de um debate no Festival ZUM, evento que ocorreu no Instituto Moreira Salles, que tem uma programação voltada à fotografia.

Aos 35 anos de idade e com uma década de carreira estabelecida no rap, o artista valoriza a cultura Hip Hop, celebrada mundialmente nesta terça-feira (12/11).

“O Hip Hop é uma cultura auxiliar no meu desenvolvimento, que me instrumentalizou de discursos, de palavras, de coisas, de signos estéticos. Isso foi importante nos meus 11, 12 anos e foi se esticando até que fui tomando conta de outros saberes, me abrindo. E alguma hora, eu me vi MC, que é também onde finco minha relação com a palavra”, conta Dalasam, em entrevista à Periferia em Movimento.

Rico Dalasam (foto Carol Curti)

Rico Dalasam (foto Carol Curti)

Primeiro rapper abertamente gay a ganhar projeção na cena cantando a partir disso, Dalasam reflete sobre seus próprios caminhos.

“Apesar de todo o carinho e de ter obras que, na minha adolescência, foram determinantes na minha cabeça, quando eu passo a exercer essa atividade e a cantar rap e entrar pro mundo comercial (onde não cabe ser romântico e uma série de outras coisas), eu preciso olhar muito fixo pros meus desejos que eu to por construir por não existir um precedente na cultura brasileira de alguém fazendo rap com as minhas credenciais”.

Ainda que note alguma abertura para artistas LGBTQIAPN+ e se anime especialmanete com o crescimento de mulheres cis no rap, ele entende que não quer disputar esse lugar.

“Eu estaria disputando com outros homens pretos, com outras vivências, capacidades, repertórios e histórias. Eu nem me disponho a esse trajeto e vou fazendo meu caminho”.

Amadurecimento

Dalasam tá mirando outras possibilidades.

Em 2023, lançou seu terceiro e mais recente álbum. “Escuro Brilhante, O Último Dia no Orfanato Tia Guga” conclui a trilogia composta também por “Dolores Dala Guardião do Alívio” (2021) e “Fim das Tentativas” (2022).

Com 10 faixas, o álbum é uma celebração ao brilho próprio, autocuidado e amadurecimento Batidas eletrônicas, violão, soul, R&B, samba ganham espaço nas composições, autobiográficas ou quase.

Entregue quando tinha um ano de idade pela mãe biológica, que era dependente química, a uma vizinha, Dalasam passava pouco tempo com a mãe que o adotou. Ela saía cedo para trabalhar e passava longas horas fora para sustentar cinco crianças, enquanto ele ficava na creche da Tia Guga.

Também fez amizades com crianças que moravam no orfanato de Tia Guga, e se deparou com a dura realidade de quem aguarda uma adoção no Brasil.

“Os trâmites e numeros de adoção no Brasil vão colocando pra depois o garoto negro, o garoto escuro, que é o meu caso também. Então, eu to falando de uma repetição, de uma coisa recorrente, de um projeto muito bem estabelecido de abandono, encarceramento e subtração de homens negros no mundo da dignidade”.

O álbum também deu origem ao podcast Ensaio Literário, com áudios que grava enquanto desenvolve a escrita de um livro sobre a temática.

“Esse disco consegue tornar mista a minha atividade. Enquanto tô correndo uma turnê, ao mesmo tempo consigo achar caminho para desenvolver essa produção literária”.

Arte de capa: Rafael Cristiano (a partir de foto de Carol Curti)

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