“Isso passa por um controle social da atividade dos agentes do estado, pelo fortalecimento das ouvidorias, por uma mudança na formação dos agentes”, propõe Danilo Dara, integrante do movimento Mães de Maio. Ele rejeita a ideia de um treinamento militar “para combater o inimigo interno, que é o elemento suspeito de cor padrão [jovem negro]”, explica. Dara disse que o número de homicídios no Brasil supera os índices de muitos países em guerra. “São cerca de 49 mil mortes, em média, nos últimos anos e boa parte cometida por agentes do Estado”, disse, citando dados da Organização das Nações Unidas (ONU).
A atividade, que ocorreu na sede do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de São Paulo, faz parte da Semana contra a Democracia dos Massacres. No próximo sábado (5), as organizações promovem um ato no Parque da Juventude, onde funcionava o prédio Casa de Detenção do Carandiru, para marcar 21 anos do episódio. Além do Mães de Maio, participam da mobilização os movimentos Periferia Ativa, Comitê contra o Genocídio da População Preta, Pobre e Periférica, Comissão Estadual de Mortos e Desaparecidos, Grupo Tortura Nunca Mais, entre outros.
A falta de uma responsabilização do Estado por esses atos de violência e a respectiva reparação das famílias é uma das principais críticas dos parentes das vítimas. “Ao longo de décadas vemos o massacre da nossa juventude, dos nossos povos tradicionais e para se ter justiça são necessárias décadas de lutas. Foram 21 anos no caso do Carandiru e já vamos para a primeira década dos crimes de maio”, criticou Débora Maria da Silva, representantes do Mães de Maio. Ela criticou a ausência de resposta por parte dos governos estadual e federal sobre o pedido de federalização das investigações desses crimes. “Enquanto eles não forem esclarecidos, isso vai continuar”.
As mortes conhecidas como Crimes de Maio ocorreram no mesmo momento em que estouraram os ataques de uma facção criminosa no estado de São Paulo contra policiais. De acordo com o movimento, os ataques resultaram em reação de grupos de extermínio com a presença de agentes do Estado. Uma das vítimas foi Ana Paula dos Santos, 20 anos, que estava grávida de nove meses. “Minha filha saiu com o marido para comprar leite e nunca mais voltaram. Eles foram mortos por um carro preto”, contou Vera Lúcia dos Santos, 58 anos, mãe da jovem. Segundo ela, o caso foi arquivado seis meses após o crime com a justificativa de ausência de provas.
O caso recente do fotojornalista Sérgio Silva, que perdeu a visão do olho esquerdo ao ser atingido por uma bala de borracha durante as manifestações em junho deste ano em São Paulo, também foi lembrado durante o ato. “A violência que foi cometida pela Polícia Militar durante as manifestações são apenas um reflexo do que se comete cotidianamente nas periferias. Já se passaram três meses após o 13 de junho e até o momento o Estado não se pronunciou sobre essa fatídica noite”, criticou o fotógrafo.
Segundo levantamento do Movimento Passe Livre (MPL), mais de 300 pessoas foram presas durante as manifestações de junho deste ano. “Sem imputar qualquer crime, a Polícia Militar deteve e encaminhou para delegacias pessoas por estarem portando tinta, vinagre, cartazes e mesmo simplesmente por ter cara de manifestante. Vemos aí a mesma lógica que leva a polícia a prender jovens negros porque eles têm cara de suspeitos”, disse Mariana Toledo, integrante do movimento em São Paulo.
A Secretaria da Segurança Pública de São Paulo (SSP) esclarece que a ação dos policiais militares durante as manifestações ocorridas no mês de junho são objetivo de investigação pela Corregedoria da Polícia Militar. Dois inquéritos (IPM) apuram, exclusivamente, casos de lesões envolvendo os jornalistas que cobriram os eventos. A SSP não compactua com eventuais abusos cometidos por uma minoria que não representa a imensa maioria da Polícia Militar.