Nesta terça-feira (5/12), a partir das 19h, a Câmara Municipal de São Paulo promove uma audiência pública para celebrar os 10 anos de escrita da Lei de Fomento à Cultura da Periferia. A proposta da audiência é promover uma celebração e mobilização para resgatar princípios que regem a lei.
O encontro foi solicitado pela vereadora Elaine Mineiro, do mandato coletivo Quilombo Periférico (PSOL) e ocorre no auditório Prestes Maia, no primeiro andar da Câmara, localizada no Viaduto Jacareí (Centro de Sâo Paulo). Elaine, inclusive, foi uma das agentes culturais que participaram da construção popular da legislação, protagonizada pelos movimentos culturais das periferias paulistanas. A movimentação durou cerca de 3 anos, com circulação por diferentes regiões da cidade e envolvimento de centenas de agentes culturais.
O resultado é um texto que prevê o apoio de coletividades culturais estabelecidas há mais de 3 anos, com atuação reconhecida nos territórios e com um núcleo mínimo de 3 pessoas. A distribuição também leva em consideração as áreas com maior concentração de famílias em situação de vulnerabilidade social.
“Tudo girou em torno dessa questão porque todos os atores, atrizes, manas e manos que participaram desse processo estavam focados em sobreviver”, lembra Katia Alves, integrante da Brava Companhia de Teatro, sediada na zona Sul de São Paulo. O grupo já acessou a Lei de Fomento ao Teatro, que também foi construída a partir da sociedade civil, mas ainda muito representada por homens cis brancos de classe média.
“De maneira geral, o percurso [de elaboração da lei] é uma potência e resistência e uma forma de dizer que a gente precisa sim ocupar o espaço de decisões, que o legislativo tem que legislar a partir das nossas demandas (…) A gente aprendeu ali entre nós o que é um orçamento participativo, dos recursos orçamentários, e isso foi feito fora da instituiçao educacional”, completa Katia.
Da escrita a partir de 2013, a lei chegou até sua aprovação em 2016 por parlamentares e a sanção pelo então prefeito Fernando Haddad (PT).
“A Lei de Fomento às Periferias é um marco nas políticas públicas na cidade de São Paulo, no Estado de São Paulo e no Brasil, porque demonstra o poder popular dos movimentos de cultura em afirmação coletiva da cultura como um direito essencial a todas as pessoas”, aponta Aloysio Letra, cantor, compositor e poeta da zona Leste paulistana.
Ele lembra que até 2016, quando a lei foi aprovada, não havia fomentos expressivos com recortes de classe e território. E ano após ano, por meio das comissões de seleção que têm representantes da sociedade civil, o programa permite o fortalecimento de grupos afirmativos e possibilita a profissionalização de artistas e agentes culturais.
“É uma prova de que o povo pobre tem projeto de mundo e pode ser propositor de politicas públicas avançadas, mesmo que numa luta contra a maré crescente de extrema direita populista”, continua Aloysio. “A lei é uma politica das periferias para as periferias que, com adaptações territoriais, poderia muito bem servir de modelo de politica pública em âmbito nacional”, reforça.
Desde que entrou em vigor, a lei distribuiu mais de R$ 70 milhões e chega à 8ª edição este ano, contemplando centenas de projetos de coletivos culturais em territórios periféricos nesse período. O objetivo principal é descentralizar os recursos, com o mínimo de R$ 20 milhões distribuídos anualmente – algo que ainda não foi alcançado.
Para se ter uma ideia, a Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo teve um orçamento total aprovado de R$ 688 milhões para 2023. E o orçamento do Theatro Municipal, sozinho, chegou a R$ 142 milhões este ano. “E se a gente nao ficar vigilante e atenta, a qualquer momento nossos representantes podem dizer que nao têm recursos e ir sucateando, por isso há a necessidade de grupos que foram contemplados nesses ultimos 10 anos se mantenham mobilizados para dizer que ‘ainda é pouco'”, salienta Katia.
Thiago Borges