Carnaval da Quebrada: diversão sem deixar de lado a luta por direitos

Carnaval da Quebrada: diversão sem deixar de lado a luta por direitos

Conversamos com quem tá organizando blocos que desfilam no Extremo Sul de São Paulo. Confira também uma seleção de percursos para colocar seu bloco na rua!

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Em ano em que a política de direto à cidade deve se restringir, durante o Carnaval mais de 600 blocos estarão na rua resistindo – e nas periferias, isso é ainda mais forte. Cada iniciativa com suas cores, suas músicas que puxam o bloco e seu propósito de existir, dividem principalmente nos últimos anos a atenção e o interesse de moradores e turistas de São Paulo com o tradicional e famoso Carnaval das escolas de samba. No Sambódromo, cobram de quem quer assistir de perto os desfiles e também de quem quer desfilar por uma escola. A transmissão ao vivo pela televisão e patrocinadores são garantidos. Diferente, o Carnaval de rua, pelo menos por enquanto, é mais democrático e tem atraído cada vez mais gente, mesmo sem muito ou nenhum investimento.

Ensaio de portas abertas é um convite à comunidade (Foto: Aline Rodrigues / Periferia em Movimento)

Ensaio de portas abertas é um convite à comunidade (Foto: Aline Rodrigues / Periferia em Movimento)


Longe dos holofotes inclusive dessa tendência dos blocos de rua na cidade, estão blocos das periferias, que constroem sua história muitas vezes sem interesse de estar no circuito oficial dos blocos carnavalesco. Isso acontece porque o objetivo de muitos deles não é atrair gente de fora, mas oferecer uma opção de diversão para os moradores da região onde ensaiam e desfilam.
“O nosso bloco começou porque ninguém tinha pra onde ir no Carnaval”, conta Bruno César Lopes, integrante do bloco Ô Grajaú, Vem Tomar no C…opo, do Extremo Sul. Em sua quarta edição, o bloco mantém o hábito de trazer nas letras de suas marchinhas uma crítica social sem deixar o bom humor e a alegria que a festa pede.
Neste ano, o tema é “Convoque sua bunda, o clima está tenso”, com um enredo que traz trechos como: “Chega de silêncio, eu vou gritar, eu vou esfregar a minha bunda na cara do Jumêncio”; e “Meu corpo, minhas regras, tem sexo e tem cor” – referências às causas defendidas pelos organizadores, que fazem uma festa onde não é permitida nenhuma forma de machismo, racismo, gordofobia, homo-lesbo-transfobia .
O grupo diz que ainda são contra pessoas em destaque no desfile e não tem uma rainha da bateria porque todas são rainhas. Quem assume o microfone e puxa as músicas que animam o bloco são duas mulheres, Cristiane Rosa e Tatiane Monte, fugindo da comum voz masculina que geralmente conduz a festa.
“Só de estar na rua já é político, mas diante da atual conjuntura e diante de todos os golpes que a gente vive, a gente achou importante colocar essa questão no tema. O que a gente faz é uma grande bagunça, mas não podia deixar de lado o golpe que aconteceu em relação à presidenta, o golpe que acontece na periferia diariamente, os golpes que vêm acontecendo com essas medidas higienistas. Eles querem cercear os nossos corpos”, destaca Cristiane Rosa.
Bruno ainda completa que “ocupar a rua sendo bicha é muito legal, porque a gente não pode. Uma coisa que eu não posso fazer no dia a dia e nesse dia eu posso. E isso tem a ver com o trajeto também. A gente quer ser visto!”.
Nesta edição, o bloco Ô Grajaú Vem Tomar no C…opo está arrecadando dinheiro com a venda de bebidas no Galpão Humbalada, onde ensaiam, para alugarem um carro de som e conseguirem contagiar ainda mais quem seguir o bloco ou apenas vê-lo passar.

No Piraporinha tem bloco afro

Bloco desfila sempre na segunda de Carnaval pelo Piraporinha (Foto: Divulgação)

Bloco desfila sempre na segunda de Carnaval pelo Piraporinha (Foto: Divulgação)


Blocos afros são minoria na cidade, mas desde 2011 o Bloco Afro É Di Santo ocupa esse espaço. Criado pelo percussionista Rabi Batukeiro, por conta de suas aulas de percussão na Casa Popular de Cultura de M´Boi Mirim, o É Di Santo surgiu da ideia de fazer música percussiva baseada em ritmos e toques de matrizes das religiões afrobrasileiras.
“Já fomos proibidos de praticar as nossas manifestações de origem afro e o Carnaval surge com a oportunidade de mostrar o poder de comunicação e união que o tambor nos proporciona.”, define Rabi.
Na edição de 2017, o bloco traz como tema “Mulher Negra, Mãos Femininas que Tocam Tambor” e também soma às discussões sobre os espaços da mulher negra na sociedade. O tema tem tudo a ver com a história do bloco que sempre teve em sua maioria mulheres integrando o grupo. Shirley Aparecida Nascimento dos Santos, percussionista da ala de surdos, está há seis anos no grupo e por conta de sua pesquisa sobre mulheres que tocam tambor sugeriu a segunda parte do título.
De acordo com Shirley, em busca de referências percussivas femininas ela se deparou com o trabalho da banda feminina Didá. “Em um documentário que assisti, Daniela Mercury classificava Didá como um balé percussivo. Pra mim é uma representação de todas as especificidades e as diferenças de uma mulher tocando tambor”.
As mulheres são maioria no Bloco Afro É Di Santo (Foto: Divulgação)

As mulheres são maioria no Bloco Afro É Di Santo (Foto: Divulgação)


Além de participar desse bloco, a percussionista também já deu aula de dança afro e divide hoje seu tempo entre os ensaios do É Di Santo e seu trabalho como professora de educação infantil na rede municipal. “O que me motiva é uma identificação. É um resgate de uma ancestralidade que vem a cada vez que eu escuto o samba-reggae e todos os ritmos que nós fazemos. Tem também um acreditar que mais pessoas precisam se apropriar dessa cultura.”
O bloco se mantém com a verba arrecadada em apresentações feitas pelo grupo.
 

Crianças e adolescentes gritam seus direitos no Carnaval

Em seu segundo ano nas ruas, o Circo Escola do Grajaú promove o “Bloco da Lona”, também no Extremo Sul. Cerca de 600 crianças e adolescentes do Circo Escola e participantes do Projeto RUAS (iniciativa do CEDECA Interlagos de mobilização e organização que discute a realidade local com os jovens) vão desfilar pelas ruas da região junto a trabalhadores do Núcleo de Proteção Jurídico Social e do Serviço de Proteção a Crianças e Adolescentes Vítimas de Violência. “Não é um carnaval para a gente simplesmente se divertir, mas é um carnaval político”, reforça Elaine Souza, gerente do Circo Escola Grajaú.
O enredo deste ano é em comemoração aos 18 anos do CEDECA Interlagos, que administra o Circo. “Na música, fazemos uma analogia como se o CEDECA fosse um adolescente completando a maioridade e que, de fato, passou por situações que passam os meninos e meninas da periferia”, conta Elaine.
Os frequentadores das atividades do Circo animarão o desfile com música, dança, malabaris, entre outras linguagens artísticas e terão a participação de integrantes do Bloco Afro É Di Santo também. Os educadores, que escreveram a música, também vêm trabalhando a história do CEDECA com seus alunos e estão acompanhando a criação de cartazes com frases falando sobre os direitos da infância e da juventude e que serão exibidos durante o trajeto do bloco.

Vai botar o bloco na rua?

Os blocos de Carnaval rolam em várias periferias da cidade e, apesar de terem os moradores locais como principal público, estão abertos para receber qualquer folião e foliã que queira se divertir com respeito às propostas de cada grupo.
Confira abaixo lista completa de blocos e se programe para colar em um ou em vários!

Sexta-feira, 24 de fevereiro

14h – Bloco da Lona – Bloco carnavalesco de crianças e adolescentes que integram o Circo Escola Grajaú. Onde? Rua Ezequiel Lopes Cardoso – Grajaú – Extremo Sul
19h30 – Bloco Afro Ilú Obá De Min – Associação paulistana sem fins lucrativos, o Ilú Obá De Min tem como base o trabalho com as culturas de matriz africana e afro-brasileira e a mulher. O objetivo da associação é preservar e divulgar a cultura negra no Brasil, mantendo diálogo cultural constante com o continente africano através dos instrumentos, dos cânticos, dos toques, da corporeidade, além de abrir espaço para idéias que visem o fortalecimento individual e coletivo das mulheres na sociedade. Onde? Praça da República – Centro

Sábado, 25 de fevereiro

10h – Bloco Urubó – Onde? Casa de Cultura Salvador Ligabue (Largo da matriz de Nossa Senhora do Ó) – Freguesia do Ó – Zona Noroeste
11h – Afoxé Oba Inã – Onde? Rua Omega, 94 – Jabaquara – Zona Sul
12h – Bloco Samba da Zimba – Onde? Praça Escolar – Cidade Dutra – Extremo Sul
15h – Grajaú Vem Tomar no C…opo – Quarta edição do bloco carnavalesco formado por artistas de companhias teatrais da região do Grajaú com o tema “Convoque sua bunda, o clima tá tenso”. Onde? Galpão Cultural Humbalada – avenida Grande São Paulo – próximo ao Terminal Grajaú – Zona Sul
15h – Corpo Fechado – Nascido no Jardim Brasil, o cordão carnavalesco Corpo Fechado tem em seus fundamentos a divulgação do samba paulista e compositores da região. Onde? Rua Crisciuma – Jardim Brasil – Zona Norte
16h – Bloco do Beco – Bloco de carnaval de rua com aproximadamente 50 ritmistas, que além de sambas enredos, toca marchinhas e outros sambas do gosto popular. Onde? Rua Salgueiro do Campo – entre as ruas Margarida de Fátima e Pinhal Velho – Jardim Ibirapuera – Zona Sul
18h – Bloco Carnavalesco do Zé Pereira – O bloco ai pelas ruas centrais do Jabaquara na quinta-feira que antecede o carnaval na cidade, tocando e cantando marchinhas. Onde? Rua Anita Costa, 135 X Rua Nelson Fernandes, 257 – Jabaquara – Zona Sul

Domingo, 26 de fevereiro 

13h – Bloco Rosão de Viver – O Bloco Rosão de Viver anima com marchinhas e sambas as ruas do Jardim das Rosas, um bairro encravado no extremo da Zona Leste. O Bloco desfila sempre a tarde o que lhe confere um público familiar. Onde? Avenida Barreira Grande – Jardim das Rosas – Extremo Leste
14h – Vem Ku nóis Ó – Onde? Largo da Matriz Velha – Avenida Itaberaba – Freguesia do Ó – Zona Noroeste
14h – Bloco do Hercu – O projeto cultural Bloco do Hercu desenvolve atividades no Bairro do Jardim Herculano há quase quatro anos. Desfila pelas ruas do bairro propondo a realização de um carnaval popular em que as pessoas possam desfilar com alegria no bairro onde residem, de forma tranquila e gratuita. Onde? Rua Ignácio Limas – Jardim Herculano – Zona Sul
15h – Arrastão da Vila Guarani – Fundado em 12 de outubro de 1983, o Arrastão faz a alegria das crianças desfilando pelas ruas do bairro com carro de som, samba-enredo próprio, temas simples e fantasias gratuitas. O bloco já disputou carnavais quando era filiado à UESP até 1996. Depois de alguns anos sem atividades, retornamos em 2007 com o desfile no bairro. Onde? Rua Domingos de Santa Maria – Vila Guarani – Jabaquara – Zona Sul

Segunda-feira, 27 de fevereiro

17h – Bloco Afro É Di Santo – Em mais um carnaval, o bloco afro É Di Santo desfila pelas ruas do bairro de Piraporinha com as cores amarelo e branco. O grupo surgiu em 2010, a partir da junção de alguns percussionistas da região do M’Boi Mirim para elaborar projetos musicais: oficinas, shows, wokshops e a formação de um bloco percussivo. Onde? Na Casa Popular de Cultura do M’Boi Mirim – Avenida Inácio Dias da Silva – Piraporinha – Zona Sul

Terça-feira, 28 de fevereiro

15h – Bloco Carnavalesco Império do Morro – Fundado nos anos 80 por um grupo de amigos amantes do samba que se uniram para comprar instrumentos de percussão com objetivo de se divertir. Onde? Esquina da Rua Inácio Dias de Oliveira com a Rua George Arié – Jardim Monte Azul – Zona Sul
16h – Itaquerendo Folia – Foliões de Itaquera aliam Carnaval à luta pela criação, fruição, difusão, circulação e consumo cultural, arte, economia criativa, sociabilização e opção de lazer. Onde? Parque Linear Rio Verde – Av. Itaquera, 7655 – Itaquera – Zona Leste
16h – Bloco de Carnaval Batuq do Glicério – O bloco é um projeto social que começou com uma doação de instrumentos musicais em 2011, com objetivo de dar orientação musical a todos da comunidade que quisesse aprender a tocar um instrumento carnavalesco. Fomentando o desenvolvimeto social de adolescentes e melhorando sua perspectiva de vida, hoje tem apoio de comerciantes da Baixada do Glicério. Onde? Rua Conde de Sarzedas, 336 (Esquina com Rua Oscar Cintra Gordinho) – Glicério – Centro
18h – Carnaval de Parelheiros – Onde? Rua Terezinha do Prado Oliveira – Parelheiros – Extremo Sul

Sábado, 04 de março 

14h – Perifolia – Iniciativa cultural da comunidade de Sapopemba com o intuito de criar uma alternativa descentralizada durante o Carnaval. A festa leva em consideração os migrantes nordestinos da região, assim diferenciando-se dos tradicionais blocos do centro da cidade. Onde? Rua Marcondes Machado – Sapopembra – Zona Leste

Domingo, 05 de março 

15h – Acadêmicos do Parque Bristol. Onde? Rua José Pinto Tavares, 120 – Parque Bristol – Zona Sudeste
 
Pós Carnaval
Sábado, 11 de março
13h – Bloco Unidos da Luta – A Ocupação Popular do Jardim da União celebrará o carnaval com um bloquinho durante o dia cheio de atrações e atividades. Contará com a participação do bloco Veterano Cidade Dutra e da Escola de Samba Unidos do Primavera,  e vai ter bingo, muita música e folia. A verba arrecadada vai ajudar a Associação de Moradores com questões relativas à ocupação. Onde? Próximo ao Terminal Varginha, na Av. Antonio Burlini, 1000 – Extremo Sul de SP.

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