Por Micaela Gluz*
As desigualdades sociais relacionadas à classe, raça e gênero criam barreiras para muitas pessoas, dificultando seu acesso a oportunidades de estudo e crescimento.
Quem mais sofre com isso são grupos historicamente excluídos, como mulheres (cis e trans), pessoas negras, indígenas e aqueles que vivem em condições de maior pobreza.
Mas como isso afeta o aprendizado dentro da escola? Esse foi o tema do curso “Desenvolvimento da Aprendizagem: Um Olhar Social para as Desigualdades de Classe, Raça e Gênero”, criado pelo Instituto Cultiva em parceria com o SINESP (Sindicato de Especialistas em Educação da Rede Municipal de São Paulo).
O curso mostrou como essas desigualdades prejudicam a educação, dificultando o acesso, a permanência, o processo de aprendizagem e a qualidade do ensino, comprometendo o direito universal à educação.
Um estudo do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), divulgado em 2023, revelou que a pobreza multidimensional – que inclui não apenas a falta de dinheiro, mas também de acesso a serviços básicos – afeta com mais intensidade aqueles que já vivem em situação de vulnerabilidade, como as mulheres, os negros, os indígenas e a população das regiões Norte e Nordeste.
Entre crianças e adolescentes negros e indígenas, 72,5% estavam em situação de pobreza multidimensional, em contraste com 49,2% entre brancos e amarelos.
Esse mesmo estudo também mostrou que as consequências da desigualdade racial pioraram ao longo dos anos. De 2017 a 2019, crianças e adolescentes negros e indígenas tiveram seus direitos privados em uma taxa 25% maior, se comparados aos brancos e amarelos.
Quanto ao acesso à educação, apesar das meninas e as mulheres terem acesso à escola de forma semelhante ao gênero masculino, elas quase sempre são retratadas de forma estereotipada nos livros didáticos e suas referências aparecem em menor número nos materiais trabalhados em sala de aula.
O ambiente escolar ainda revela desigualdades sociais em diversas outras situações. Em bairros periféricos, por exemplo, as aulas podem ser canceladas por causa da violência ou devido a algum risco ambiental na região. Escolas que atendem majoritariamente alunos negros e indígenas muitas vezes não recebem a mesma manutenção que outras.
Além disso, estudantes podem ser tratados de forma diferente por causa de sua identidade de gênero ou orientação sexual.
Mas a escola não é feita só de aulas. A vivência dos alunos fora da sala de aula também influencia seu aprendizado. Se um estudante não se sente acolhido pelos professores ou funcionários, ele pode perder o interesse pela escola. A falta de um lugar adequado para estudar em casa ou o preconceito dos colegas também afetam diretamente seu desempenho.
Por essa razão, cada vez que falamos sobre desigualdades de raça, classe e gênero no Brasil devemos lembrar como essas questões estão conectadas e moldam as relações de poder na sociedade.
A opressão contra mulheres negras, por exemplo, não acontece por acaso, mas sim porque o racismo, o machismo e o capitalismo criaram e mantêm suas raízes desde cedo na vida dos brasileiros, incluindo o ambiente escolar.
É essencial entender como essas desigualdades funcionam para lutar por uma sociedade mais justa, onde todas as pessoas possam ter as mesmas oportunidades, sem que a classe, a raça ou o gênero não sejam obstáculos para ninguém.
Apesar dos avanços, ainda há muito a ser feito para mudar essa realidade. No ambiente escolar, que faz parte de um sistema desigual, é fundamental investir em práticas que tornem a escola um espaço mais democrático e inclusivo, garantindo a todos uma educação de qualidade, independentemente de sua origem ou condição social.
SOBRE A AUTORA
*Micaela Gluz é pedagoga, doutoranda em Educação pela UFRGS e coordenadora da área de Educação do Instituto Cultiva, organização fundada em 2022 com foco na educação para cidadania e participação social
Colaboração