Segurança pública: Mortes em geral diminuem, mas crimes contra mulheres, crianças e pessoas LGBTQIA+ aumentam

Segurança pública: Mortes em geral diminuem, mas crimes contra mulheres, crianças e pessoas LGBTQIA+ aumentam

Pessoas negras são maioria entre vítimas em todos os indicadores do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, que apresenta os dados de 2022. Denúncias de racismo e número de pessoas encarceradas também aumentam no período

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Com informações da Agência Brasil

O Brasil registrou 47.508 mortes violentas intencionais no ano passado – em 2021, foram 48.431. A taxa de mortes violentas intencionais caiu 2,4% entre um ano e outro: de 24 para 23,4 para cada 100 mil habitantes. Os dados, divulgados na última quinta-feira (20/7), são do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2023, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).

São consideradas mortes violentas não intencionais aquelas decorrentes de homicídios dolosos, latrocínio, lesão corporal seguida de morte, intervenção policial e morte de policiais. Nas regiões Sul e Centro-oeste, as taxas cresceram 3,4% e 0,8%, respectivamente. As demais regiões registraram queda: Sudeste (-2%); Norte (-2,7%); e Nordeste (-4,5%).

O Estado de São Paulo, proporcionalmente, é o menos letal do País. Em 2022, a unidade da federação registrou 3.735 mortes violentas intencionais e uma taxa de 8,4 por 100 mil habitantes. Apesar de registrar queda de mortes por intervenção policial, no geral o Estado teve alta de 1,3% nas mortes no ano passado. Já a cidade de São Paulo teve 691 mortes violentas intencionais em 2022, 18 a menos que no ano anterior.

O Amapá lidera o ranking de estado mais violento do País em 2022, com taxa de MVI de 50,6 por 100 mil habitantes, mais que o dobro da média nacional (23,4/100mil). O segundo estado mais letal foi a Bahia, com taxa de 47,1 por 100 mil habitantes, seguido do o Amazonas (38,8/100 mil).

Clique nas imagens para conferir um resumo dos principais números do Anuário (a matéria continua a seguir)

Racismo

Apesar da queda na taxa, o perfil das vítimas de mortes violentas intencionais não se alterou significativamente no ano passado na comparação com o anterior. Os dados do FBSP mostram que, em média, 91,4% das mortes violentas intencionais vitimaram homens, enquanto 8,6%, mulheres. Já em relação a óbitos em intervenções policiais, 99,2% das vítimas eram do sexo masculino.

Em relação ao perfil étnico-racial das vítimas de MVI em 2022, 76,5% eram pessoas negras – o grupo é o mais vitimado, independentemente da ocorrência registrada, e chegou a 83,1% das vítimas de intervenções policiais. Mesmo entre latrocínios, que são os roubos seguidos de morte, a vitimização de pessoas negras é maior do que a participação proporcional delas na composição demográfica da população brasileira.

“Chama atenção que não exista um debate mais amplo sobre suas origens, causas e possibilidades de redução. É um debate que ainda é tabu e interditado entre os tomadores de decisão nas organizações de segurança pública”, destaca o texto do anuário.

O FBSP destaca ainda outro dado que pouco varia em relação a série histórica: 50,3% das vítimas de mortes violentas intencionais em 2022 tinham entre 12 e 29 anos. Dentre as pessoas mortas em intervenções policiais, o grupo etário concentra 75% das mortes.

Violência Sexual

Os dados do anuário mostram que o número de registros de estupros e estupros de vulnerável em 2022 foi o maior já registrado pelo FBSP: 74.930 vítimas, sendo 88,7% mulheres e 11,3% homens.

“Estes números correspondem aos casos que foram notificados às autoridades policiais e, portanto, representam apenas uma fração da violência sexual experimentada por mulheres e homens, meninas e meninos”, diz o texto do anuário.

Em relação ao ano de 2021, a taxa de estupro e estupro de vulnerável cresceu 8,2% e chegou a 36,9 casos a cada 100 mil habitantes. Exclusivamente os casos estupro somaram 18.110 vítimas em 2022, um crescimento de 7% em relação ao ano anterior. Já os casos de estupro de vulnerável, com um total de 56.820 vítimas, teve incremento de 8,6%.

Os dados do FBSP mostram que 24,2% das vítimas de estupros, em 2022, foram homens e mulheres com mais de 14 anos, e que 75,8% eram incapazes de consentir, fosse pela idade (com menos de 14 anos), ou por qualquer outro motivo (deficiência ou enfermidade).

Segundo o Fórum, 10,4% das vítimas de estupro eram bebês e crianças, com idade entre 0 e 4 anos; 17,7% das vítimas tinham entre 5 e 9 anos e 33,2% entre 10 e 13 anos (a faixa etária mais afetada pelo crime). Ou seja, segundo os dados, 61,4% das vítimas tinham no máximo 13 anos.

“Podemos ter como hipótese que estamos diante de um aumento das notificações já que as vítimas estão mais informadas e empoderadas. No entanto, este argumento precisa ser relativizado quando verificamos o perfil das vítimas. No Brasil, 6 em cada 10 vítimas são vulneráveis com idades entre 0 e 13 anos, que são vítimas de familiares e outros conhecidos. Ou seja, ainda que estas crianças e adolescentes estejam mais informadas sobre o que é o abuso, é difícil crer na hipótese do empoderamento como única explicação para o fenômeno”, ressalva o anuário.

Considerando a autoria indicada no boletim de ocorrência, assim como em anos anteriores, na maioria absoluta dos casos quem abusa são pessoas conhecidas das vítimas (82,7%), e apenas 17,3% dos registros tinham pessoas desconhecidas como autoras da violência sexual. Dentre as crianças e adolescentes entre 0 e 13 anos de idade vítimas de estupro, os principais autores são familiares (64,4% dos casos) e 21,6% são conhecidos da vítima, mas sem relação de parentesco.

Pessoas negras seguem sendo as principais vítimas da violência sexual, mas houve crescimento da proporção em relação a 2021. Ano passado, 56,8% das vítimas eram pretas ou pardas (no ano anterior eram 52,2%). Em relação às demais, 42,3% eram brancas, 0,5% indígenas e 0,4% amarelas.

Violência contra mulher e LGBTfobia

Os feminicídios, que são mortes violentas de mulheres baseadas em sua condição de gênero, chegaram a 1.437 casos no Brasil – em 2021, foram 1.347 casos, um aumento de 6,1%. Os homicídios de mulheres aumentaram 1,2% de um ano para o outro. Os números vão na contramão da queda de mortes violentas intencionais em geral.

As tentativas de feminicídio também cresceram: 16,9%, chegando a 2.563 situações notificadas. A morte violenta é a última etapa de uma escala de violência, que tem aumentado. Os casos de lesão corporal por violência doméstica contra mulheres saltaram de 237.596, em 2021, para 245.713 em 2022.

Já os casos de LGBTfobia enquadrados na lei do racismo cresceram 54% em 2022: foram 488 ocorrências, ante 316 no ano anterior. O Fórum Brasileiro de Segurança Pública também computou os crimes contra a comunidade LGBTQIA+ não inseridos como racismo. Lesão corporal é o mais recorrente, com 2.324 casos no último ano, seguido de homicídios dolosos (163 relatos) e estupros (199). O Fórum não conseguiu levantar dados junto às secretarias da segurança pública de Acre, Bahia, Maranhão, Rio de Janeiro e São Paulo.

Crimes contra crianças e adolescentes

O número de mortes violentas intencionais de crianças e adolescentes caiu no Brasil: de 2.556, em 2021, para 2.489 em 2022, uma redução de 2,6%. O anuário revela que, dentre as vítimas de zero a 11 anos em 2022, 45,9% eram do sexo feminino e 54,1% do sexo masculino. Essas mortes foram decorrentes, sobretudo, da violência doméstica e intrafamiliar. Já dentre as vítimas de 12 a 17 anos, 89,7% eram do sexo masculino e 10,3%, do sexo feminino.

“O gênero como um fator de risco para os meninos, portanto, só se impõe entre os adolescentes quando as mortes ocorrem prioritariamente como consequência da violência urbana”, diz o anuário.

Os dados mostram, ainda, que 67,1% das vítimas de zero a 11 anos eram negras, e 85,1% na faixa etária de 12 a 17 anos, “evidenciando que a desigualdade racial é parte estruturante da problemática das mortes violentas no país e que se acentua na medida em que os anos passam na vida do sujeito”.

Já os crimes sexuais apresentaram altas expressivas: os estupros subiram 15,3% e exploração sexual, 16,4%. Por faixa etária, foram quase 41 mil vítimas de zero a 13 anos, das quais quase 7 mil tinham entre 0 e 4 anos; mais de 11 mil vítimas entre 5 e 9 anos; mais de 22 mil entre 10 e 13 anos; e mais de 11 mil entre 14 e 17 anos. As vítimas negras (pretas e pardas) foram a maior parte em praticamente todas as idades, principalmente na faixa etária dos 11 aos 14 anos, em que representam aproximadamente 59% do total.

Demais crimes não letais contra crianças e adolescentes também tiveram expansão: abandono de incapaz cresceu de 8.197 casos em 2021 para 9.348 em 2022, um salto de 14%; ocorrências de maus tratos subiram de 19.799 casos (2021) para 22.527 (2022), alta de 13,8%; e lesão corporal em violência doméstica teve elevação de 14.856 casos (2021) para 15.370 (2022), aumento de 3,5%.

Encarceramento

A população negra encarcerada no sistema penitenciário brasileiro atingiu o maior patamar da série histórica: em 2022, havia 442.033 pessoas negras encarcerados no país, ou 68,2% do total das pessoas presas. Em 2021, essa proporção era de 67,5%. Há 18 anos, em 2005, representavam 58,4% das pessoas presas no país. Já o total de pessoas brancas no sistema prisional passou de 39,8% para 30,4% no mesmo período. No total, a quantidade de pessoas no sistema carcerário brasileiro aumentou de 815.165 em 2021 para 826.740, em 2022.

“O sistema prisional brasileiro escancara o racismo estrutural. Se de 2005 a 2022 houve crescimento de 215% da população branca encarcerada, houve crescimento de 381,3% da população negra. Em 2005, 58,4% do total da população prisional era negra, em 2022, esse percentual foi de 68,2%, o maior da série histórica disponível”, destaca o texto do anuário.

Em relação a adolescentes cumprindo medida socioeducativa em meio fechado, o número continua caindo: em 2022, eram 12.154 nessa condição, 6,3% a menos que em 2021. Em 2018, por exemplo, eram 24.510. Entre as hipóteses, estão a queda nos registros de roubos, um dos atos infracionais de maior incidência nas medidas privativas de liberdade; a diminuição do número de apreensão de adolescentes pelas forças policiais nos estados do São Paulo e Rio de Janeiro; e a decisão da justiça que determinou que as unidades onde cumprem as medidas socioeducativas não ultrapassem a capacidade de lotação.

Investimentos e metas

Segundo o anuário, os investimentos em segurança pública no país em 2022 – somadas todas as esferas –, totalizaram R$ 124,8 bilhões, um crescimento de 11,6% em relação ao ano anterior. Já os investimentos da União (R$ 14,4 bilhões) apresentaram crescimento menor do que o dos estados, de 2,6%.

O FBSP destaca que o Ministério da Justiça e Segurança Pública revisou o Plano Nacional de Segurança Pública e Defesa Social e estabeleceu metas de redução de homicídios dolosos, de lesões corporais seguidas de morte e de latrocínios. Até 2030, a meta de redução desses crimes somados deveria alcançar a taxa de 17 mortes para cada grupo de 100 mil habitantes.

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