Por Thiago Borges. Artes: Rafael Cristiano
Observação: texto atualizado em 19 de outubro para contemplar resultados do primeiro turno das eleições
A fome e a pobreza são resultados da insensibilidade dos governos atuais, frutos da política do “fique em casa” durante a pandemia ou situações inesperadas? O diagnóstico pode variar, dependendo do candidato ao Governo do Estado de São Paulo, assim como as respostas a esse cenário.
Em todo País, são 33,1 milhões de pessoas passando fome e 125 milhões em insegurança alimentar (sem acesso a 3 refeições diárias), de acordo com a Rede Penssan. Apenas no Estado de São Paulo, são 6,8 milhões de pessoas em situação de fome. Com o desemprego atingindo 9,1% da população paulista e a inflação de alimentos a quase 10% nos primeiros meses de 2022, a pobreza se intensifica e dificulta colocar comida na mesa.
Nossa reportagem avaliou as propostas para esses problemas considerando os programas de 3 candidatos mais colocados na disputa para esse cargo no último dia 2 de outubro: o ex-prefeito Fernando Haddad (PT), apoiado por Lula e líder nas pesquisas de intenção de voto; e Tarcísio de Freitas (Republicanos), indicado por Bolsonaro. Ambos foram os mais votados e agora disputam o segundo turno, que acontece dia 30.
O texto também avalia as propostas do atual governador Rodrigo Garcia (PSDB), que assumiu a função em abril, após a saída de João Doria, e foi derrotado.
Confira abaixo em ordem alfabética!
Fernando Haddad (PT)
O candidato petista inicia o plano de governo citando o combate às desigualdades, com geração de emprego e renda, e dedica o primeiro capítulo a um “Programa Emergencial de Combate à Fome e à Miséria”. No texto, Haddad promete criar um fundo para distribuir cestas básicas, leite e vale-compras de alimentos saudáveis para famílias mais vulneráveis. Também fala em atuar com municípios para mapear e financiar ações do tipo e apoiar iniciativas de movimentos sociais, coletivos e comunidades.
Haddad cita a ampliação da rede de restaurantespopulares Bom Prato, a criação de cozinhas comunitárias e zerar o imposto estadual (ICMS) para carnes e itens da cesta básica. Para garantir a segurança alimentar a médio e longo prazo, o candidato de Lula promete ainda fomentar uma rede de banco de alimentos e mercados populares, promover a agricultura urbana para combater os desertos alimentares nas cidades e financiar e favorecer a compra de itens da agricultura familiar.
Outros pontos do programa emergencial são a transferência de renda para famílias em situação de miséria por meio dos programas já existentes; e a retomada de obras paralisadas para gerar emprego de forma rápida e ativar a economia do Estado.
Em seu plano, Haddad propõe erradicar a pobreza e promover direitos sociais com a Renda Básica da Cidadania e pretende instituir territórios de proteção social. Com isso, quer ampliar programas estaduais como o Renda Cidadã e Bolsa do Povo, “que atualmente operam benefícios reduzidos e descontínuos”, segundo o candidato.
O petista propõe aumentar o salário mínimo paulista para R$ 1.580, com uma política de valorização real, e trabalhar pela regulação e garantia de direitos trabalhistas a profissionais que atuam com mediação de plataformas como Ifood, Uber e 99.
O candidato também fala em qualificação profissional e acesso ao mercado de trabalho por pessoas LGBTQIA+, garantir políticas de acesso a jovens que saíram do sistema carcerário, criar um programa de empregabilidade de pessoas com deficiência e apoiar municípios na capacitação de pessoas em situação de rua. Diante da evasão escolar, propõe criar o Cartão do Estudante para garantir um valor mensal suficiente para conciliar estudos com a necessidade de complemento à renda familiar.
Para estimular o empreendedorismo, Haddad promete financiamento a fundo perdido para mulheres chefes de família com crianças e população afrodescendente, além de incentivar pequenos negócios de pessoas com deficiência e a geração de renda por meio da coleta de recicláveis por catadores.
Haddad pretende fortalecer a economia criativa e a economia solidária, com lei regulamentar própria, acesso a crédito e compras públicas, além de promover uma reindustrialização de baixo carbono a médio e longo prazo.
Com 144 páginas, a fome aparece 19 vezes no documento. A palavra pobreza é citada 7 vezes, nas propostas de políticas sociais diversas, de segurança pública e de moradia. Já periferias e favelas aparecem 9 vezes, quando o candidato fala em expansão de políticas públicas, programas de urbanismo e no potencial criativo dos territórios. Acesse na íntegra aqui.
Tarcísio Freitas (Republicanos)
Logo na abertura do documento, o candidato bolsonarista fala em dar atenção à população mais vulnerável e agir com políticas públicas para devolver o emprego e a renda, possibilitando que as pessoas levem o “alimento novamente para dentro de casa”. Ele responsabiliza as gestões anteriores e o que considera como combate inadequado à pandemia, que teria impossibilitado que as pessoas saíssem de casa para trabalhar, perdendo o sustento e ampliando a pobreza e a fome.
“Não existe política social sustentável que não seja geradora de oportunidades, de esperança, de trabalho e renda”, promete o militar da reserva e ex-ministro de Bolsonaro.
Tarcísio destaca que o Estado de São Paulo tem quase 6 milhões de pessoas que dependem do Auxílio Brasil e há mais de 778 mil pessoas beneficiárias do Benefício de Proteção Continuada (BPC). Sem especificar de que forma faria isso, ele aponta que pretende ampliar programas de transferência de renda e de segurança alimentar alinhados ao governo federal.
O candidato lembra o grande número de favelas, que chegam a 1.600 apenas na cidade de São Paulo e abrigam mais de 400 mil pessoas. E, para superar uma condição de pobreza que aponta nesses territórios, quer estimular o empreendedorismo nas favelas com a formalização via MEI (microempreendedor individual) e facilitar o acesso ao crédito para micro e pequenas empresas.
Também propõe a oferta de microcrédito e assessoria de negócios especialmente a mulheres “vulneráveis”, assim como intensificar e ampliar a criação de oportunidades de emprego e renda nas regiões mais vulneráveis do Estado. Segundo o documento, o intuito é promover inclusão social por meio de capacitação profissional, utilizando para isso a estrutura do Centro Paula Souza, do Banco do Povo e em parceria com o Sistema S.
O candidato pretende ainda aumentar a produtividade e diminuir impostos para grandes empresas; apoiar a transição na agricultura para a produção de alimentos orgânicos e de origem agroecológica; e apostar na cultura e na economia criativa, inclusive com “respeito à pluralidade e à diversidade, combatendo quaisquer formas de discriminação”, para geração de emprego e renda.
O documento com 43 páginas cita a fome apenas 1 vez, como consequência das medidas de restrição durante a pandemia. A pobreza é citada 3 vezes. A geração de emprego é citada nas propostas relacionadas ao atendimento da “população mais vulnerável”, nos estímulos ao empreendedorismo e em parcerias com a iniciativa privada. Periferias e favelas aparecem 7 vezes, quando o candidato promete “ordem social”, regularização de moradias e estímulo ao empreendedorismo. Acesse na íntegra aqui.
Rodrigo Garcia (PSDB)
Defendendo a continuidade dos governos do PSDB, que comanda o estado há 28 anos, o ex-vice de Doria e atual governador começa o plano tecendo elogios ao povo paulista e diz que há melhorias a fazer, sem citar erros, mas “reconhecendo desacertos”.
Também de início, Garcia fala da necessidade de olhar para “os que mais precisam”, em especial em um País que viu a pobreza subir – atribuindo a crise de forma indireta ao governo federal, que não é citado. E diante disso, o programa propõe a prosperidade com inclusão social, ao mesmo tempo em que o governo estadual deve estimular o empreendedorismo e a produtividade das empresas.
Educação e Emprego são tópicos eleitos como prioridade máxima para reverter o quadro de pobreza e que comprometem a empregabilidade e a qualificação da mão de obra para empresas.
Em seu plano de desenvolvimento econômico, o primeiro eixo é o social, em que o tucano promete igualdade de oportunidades, inclusão produtiva e empregabilidade das pessoas mais vulneráveis, inclusive com políticas de transferência de renda.
Com números a apresentar, Garcia cita as transferências de renda feitas pelo Bolsa do Povo, que chegaram a mais de 700 mil famílias durante a pandemia, assim como o Vale Gás e o Bolsa Trabalho. Também menciona a distribuição de 4,6 milhões de cestas básicas e a abertura de 19 novas unidades da rede de restaurantes populares Bom Prato.
Num próximo mandato, ele pretende fortalecer essas iniciativas, abrir cozinhas comunitárias e criar um novo programa: Agente de Desenvolvimento Familiar. Nessa função, profissionais vão atuar com o diagnóstico e acompanhamento de famílias pobres para acesso a serviços públicos, qualificação profissional e geração de renda. Não fica nítido no programa como seria essa execução e em que ela difere dos Agentes SUAS, profissionais dos serviços de assistência social que atuam nas prefeituras municipais junto às famílias incluídas no Cadastro Único.
Garcia promete ainda aumentar o número de estudantes que recebem bolsa para não abandonar a escola, ampliar o pagamento de bolsa-auxílio a mulheres empreendedoras com foco no desenvolvimento de seus negócios, além de empregar pessoas recém-formadas em empresas estatais. O governador pretende expandir a formação técnica e profissional das FATECs, ETECs e pela Univesp, capacitar jovens para o primeiro emprego no turismo e atuar pelo acesso ao mercado de trabalho pela população LGBTQIA+.
No plano para a agricultura, um dos eixos orientadores do candidato à reeleição é de Segurança Alimentar, Geração, Distribuição e Aumento de Renda, mas o texto trata o assunto de forma genérica ao citar parcerias entre o setor com centros de pesquisa e do fomento a associações de pequenos e médios produtores para garantir maior capacidade de produção. E no eixo de desenvolvimento econômico, o candidato quer investir na internacionalização de empresas e atrair investimentos para garantir empregos de qualidade e renda para “cuidar das famílias mais pobres”.
A fome aparece apenas uma vez no programa de 46 páginas, quando o atual governador cita a campanha de arrecadação Vacina contra a Fome. A pobreza aparece 8 vezes no plano de Garcia, que coloca a situação como fator central nas propostas de desenvolvimento social. Periferias e favelas não são mencionadas no documento. Acesse na íntegra aqui.
Este conteúdo foi produzido no âmbito do projeto Planeta Território, uma iniciativa da Território da Notícia com apoio do Instituto Clima e Sociedade para fomentar e distribuir informação de qualidade sobre a emergência climática, o contexto eleitoral e o impacto na população periférica por meio de totens digitais em estabelecimentos comerciais das periferias de São Paulo
Thiago Borges, Rafael Cristiano