A jornada de lutas contra a redução da maioridade penal dos atuais 18 para os 16 anos, que está em tramitação na Câmara dos Deputados, ganha força esta semana com a realização de debates, fóruns, atos e intervenções públicas em todo País.
Nesta terça (28 de abril), movimentos populares, juristas e acadêmicos se reuniram na Faculdade de Direito da USP em um ato público contra a PEC 171, que propõe a redução.
Deu na Rede Brasil Atual:
Entidades, movimentos sociais, autoridades do meio jurídico e político que lutam por direitos humanos, direitos da criança e do adolescente, dos negros e da periferia lotaram o espaço.
Conanda, Conectas, CUT, Associação Juízes para a Democracia, Levante Popular, Instituto Terra e Cidadania, Central de Movimentos Populares e o Centro Acadêmico XI de Agosto estavam representados.
Débora da Silva, do Movimento Mães de Maio, cobrou investimentos em políticas públicas de saúde e educação, em vez da redução da maioridade, e denunciou a perseguição contra a juventude da periferia: “É muito fácil pedir a redução e jogar o problema em cima da população pobre, preta e periférica, porque são eles que estão atrás das grades. Estamos falando de populações empobrecidas que vem sendo penalizadas. Nós queremos o nosso dinheiro na saúde e na educação, e não atrás de uma prisão”.
Débora lembrou também que, no próximo dia 15 de maio, completa-se 9 anos da ocorrência dos chamados ‘Crimes de Maio’ sem qualquer resposta das autoridades ou punição para os envolvidos. “O grito é de uma mãe, e nós vamos até o fim”, prometeu, puxando o grito da plateia: “Não, não, não! Não queremos redução! Chega de chacina”.
O jurista e ex-ministro da justiça do governo FHC, Miguel Reale Jr., também presente no ato, “repleto de entusiasmo e indignado”, afirmou que a PEC 171 não passa de uma fraude. “É uma fraude. É uma mentira que se construiu longe de todos os dados que aí se encontram, nos Fóruns e nas estatísticas demonstrativas, de que a criminalidade praticada por menores é de índices extremamente inferiores do que a criminalidade praticada pelos maiores.”
Miguel Reale acusou ainda os deputados de estarem “jogando para a plateia, como se a fonte de toda a insegurança nacional fosse o problema da maioridade penal”.
O advogado criminalista, e também ex-ministro da justiça do governo FHC, José Carlos Dias, fez a leitura do manifesto que deve ser o ponto de partida de todo o trabalho, não só por juristas, mas pela sociedade civil e por movimentos populares presentes na luta contra a redução.
“Das arcadas do Largo de São Francisco, do chamado território livre da velha, e sempre nova, Academia de Direito, dirigimos este manifesto popular e acadêmico contra a redução da maioridade penal, fruto do dever que temos, cientes e conscientes das mazelas da nossa democracia formal, de lutar pelos ideais que possa nos levar, um dia, a uma democracia real e verdadeiramente igualitária”, diz um trecho do manifesto lido por José Carlos Dias.
O documento diz, ainda, que a idade de 18 anos completos para que sejam aplicadas penas através do sistema de justiça criminal é uma conquista do processo civilizatório, e que qualquer recuo não será admitido.
O cientista político e diplomata da ONU, Paulo Sérgio Pinheiro, reafirmou que a maior parte dos crimes cometidos, no Brasil, são praticados por adultos. Para ele, o esforço do estado democrático não deve ser de despejar mais e mais adolescentes miseráveis, com baixa escolaridade e afrodescendentes, no sistema penal de adultos.
“A Câmara, sob a hegemonia das bancadas da bala, evangélica, empresarial e ruralista, está se aproveitando, por isso é oportunista, de uma conjuntura de crise para impor ao país uma agenda conservadora, de direita e extrema-direita”, disse Paulo Sérgio, que teme que, após a redução da maioridade penal, os deputados revoguem o Estatuto do Desarmamento e, por fim, instituam a pena de morte.
E a Agência Brasil destaca, aqui e aqui, a campanha “Amanhecer Contra a Redução”, que tomou mais de 400 praças em todo o Brasil com intervenções contra a proposta:
Parte da população de pelo menos 70 cidades brasileiras passou a noite em vigília contra a redução da maioridade penal. O evento “Amanhecer contra a Redução” foi organizado por meio do Facebook com a adesão de grupos e entidades de defesa dos direitos da criança e do adolescente. Hoje, a partir das 14 horas, ainda está previsto um tuitaço nas redes sociais com a hastag: ReduçãoNãoÉSolução.
Durante esta madrugada, diversas pessoas levaram faixas, cartazes, panfletos e intervenções artísticas nas ruas e praças de cidades em mais de 20 estados.
As atividades foram organizadas por diversos grupos. O Centro de Criação de Imagem Popular (Cecip) foi uma das organizações a participar do evento no Rio de Janeiro. Maria Mostafa, integrante do Centro, explicou o objetivo da ação.
“É uma atividade não só para as instituições, mas pra população de uma forma geral. Pra sociedade civil se organizar e se manifestar contra a redução da maioridade penal. Pra dar visibilidade à causa, porque a gente não teve até agora uma campanha organizada contra a redução. A gente vê muitos discutindo, mas as pessoas que são contra ainda não se mobilizaram. Então essa é a primeira grande campanha contra a redução que tá tramitando no Congresso.”
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Em São Paulo, aproximadamente 15 integrantes do Coletivo Arrua distribuiu panfletos, pintou cartazes e empinou pipas, para simbolizar a esperança na juventude.
“A pipa faz referência direta ao menino e à menina brincando na rua. É um símbolo interessante para mostrar que a juventude não é um problema, e sim uma esperança”, disse Daniel Angelin, membro do coletivo. Segundo ele, a mesma mobilização ocorreu no início desta manhã em 300 praças brasileiras.
“Esse tipo de medida, de reduzir a maioridade, é contra a concepção de juventude que está na Constituição, uma fase de formação em que o jovem está se preparando para a vida adulta para ter um papel mais importante na sociedade. Ele deve ser protegido e não ser acusado pelo problema da violência, que é amplo, é muito mais significativo em outras idades”, disse Daniel.
Jaime Cabral, que também é membro do coletivo, argumenta que os jovens deveriam ter mais acesso a instrumentos culturais. “A juventude precisa de centros culturais, de universidades, de escolas e não de encarceramento. Menos de 1% dos crimes no país é cometido por jovens. Então, por que tratar a juventude como um dos principais atores dos crimes no país?”, indagou.
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Nos próximos dias, o Periferia em Movimento deve publicar outras matérias sobre a proposta de redução da maioridade penal e como isso pode impactar a vida das pessoas, especialmente a população mais pobre e das periferias.
Redação PEM