De Geração para Geração | Neste fim de ano, marcado por reencontros familiares ou por saudades de quem não está mais entre nós, a Periferia em Movimento publica uma série de textos sobre a importância dessas relações com pessoas de diferentes gerações para o desenvolvimento infantil
A repórter Paula Sant’Ana escreve sobre Pedro Ariel Salvador
Pedro Ariel Salvador tem 21 anos e é nascido e criado na periferia do Grajaú, extremo Sul de São Paulo. O editor de vídeo da Periferia em Movimento foi, muita das vezes, criado por seu irmão mais velho, Gelson Salvador, enquanto o pai trabalhava fora, em uma lanchonete em Santo Amaro; e a mãe, dona de casa, saía para resolver coisas do dia a dia, como ir ao mercado e compras, por exemplo.
Não existe uma ordem linear ou cronológica para Pedro, que não faz ideia de quando entendeu seu irmão como figura “paterna”. Mas ele lembra que, mesmo quando as responsabilidades chegaram em sua vida, o irmão o ajudava e tentava acompanhar sua rotina.
“Ele também era novo, tava começando a faculdade (…) Tava estudando e trabalhando. E teve um período que eu tava entendendo mais as coisas, que ele não tava em casa. Mas tinha esse afeto comigo, então independente de não estar em casa, quando chegava ia atrás de mim, trocar uma ideia”, conta.
A diferença de 12 anos de idade fez com que os irmãos vivessem períodos distintos. Ainda na infância, a influência do irmão artista plástico, grafiteiro e professor foi de forma sutil e pouco perceptível, através da proximidade física e do fato de se inspirar nele, indo além das profissões mais “convencionais” e chamando atenção para o mundo artístico.
“Lembro de ter 9 anos e ele estar editando vídeo no movie maker, e eu estar do lado, olhando ele editar vídeo e ficar muito interessado. [Lembro dele] sair pra ir pra faculdade e eu ligar o computador para mexer no movie maker pra ver como funcionava esse programa. Através de um interesse que ele tinha na época… E hoje em dia eu sou editor de vídeo”, rememora.
Há cerca de 2 anos, Pedro mora com u companheire, mas mantém contato com sua família, principalmente o irmão mais velho. Gelson também teve papel fundamental num período importante da vida do caçula. Por volta dos 16 anos, Pedro passava por uma período de entender-se como pessoa trans e realizava acompanhamento terapêutico para saber lidar com alguns destes sentimentos, principalmente na parte de contar aos familiares sobre o que é ser um menino trans e quais seriam seus próximos passos nessa transição.
“Sentou nós 4, né? Eu, meu pai, meu irmão, minha mãe. Meu irmão estava do meu lado e eu segurando na mão dele, contei que era trans, chorei horrores e meu irmão sempre do meu lado me apoiando. Ai, fico até emocionado de falar, porque desde sempre ele realmente esteve do meu lado, e não é uma coisa de só falar, ele realmente tava”.
O momento agora é de resgate e de entender os processos que o trouxeram até aqui. Isso desde a infância de seu pai e de sua mãe – e o fato de que isso influenciou na sua estrutura familiar, pois existe um ideal mais tradicional. Porém, Pedro entendeu que os laços vão além dos paternos e maternos. “Hoje em dia eu entendo que essas coisas não são tão importantes, mas na época a gente era estimulado a ter necessidade de ter isso”. Laços também podem ser de irmandade.
Este conteúdo faz parte da série de reportagens “De Geração para Geração”, da Periferia em Movimento, e conta com apoio da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal (FMCSV)
Paula Sant'Ana