Aulas presenciais: Entre o medo de quem fica em casa, a ansiedade de quem volta e a acolhida pela escola

Aulas presenciais: Entre o medo de quem fica em casa, a ansiedade de quem volta e a acolhida pela escola

Nesta reportagem, apontamos como famílias têm encarado a situação, como escolas têm lidado e a importância de considerar a perspectiva da criança

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Tempo de leitura: 7 minutos

Por Aline Rodrigues

A contragosto da análise de diferentes especialistas em infectologia sobre os riscos de contágio de covid-19, este mês de agosto marca o retorno às aulas presenciais em escolas da cidade de São Paulo, da região metropolitana e em outras partes do País.

De um lado, profissionais com receio, preparam o ambiente mais acolhedor e seguro possível. De outro, famílias vivem a dúvida de levar as crianças, ainda com o medo de contágio possível, mas sabendo que levar as crianças para a escola também significa garantia de direitos para ela e para o restante da família. E no centro, as crianças e suas possibilidades de desenvolvimento.

“Estamos trabalhando muito a ansiedade. As famílias também estão ansiosas, porque a pandemia ainda não acabou, nós sabemos que nossas crianças ainda não foram vacinadas”, relata Valdeci Jesus, professora de educação infantil da Rede Municipal de Educação de São Paulo, que se dedica a seguir os protocolos de segurança indicados pela secretaria de educação.

A escola de Valdeci recebeu kits de segurança para a equipe e para ser disponibilizado para as crianças. “Estamos ainda muito inseguros, mas fazendo o possível para que as crianças exerçam o direito à educação de qualidade”, conta.

“É um misto de ansiedade, medo, com um ‘agora vou conseguir me organizar enquanto mulher na sociedade com todas as outras demandas além dos cuidados com a criança’”, aponta Jaqueline Phelipini, mãe da Aisha, 3 anos, que é integrante da Coletiva Mamas Quebras e Território Samauma.

Como Mamas Quebras, ela tem acompanhado diversos relatos da reação das crianças com essa volta para a escola em um ambiente muito novo, ainda entendendo o que é lidar com as necessidades de distanciamento e uso de máscaras no convívio escolar, em um ritmo diferente.

Também há um envolvimento maior das famílias com a rotina da escola, no sentido de saber se “está tudo bem”.

O assunto foi tema de uma conversa sobre Primeira Infância, Escola e Direitos realizada na segunda-feira (16/8), pela Periferia em Movimento. Além de Valdeci e Jaqueline, participaram a psicóloga Elânia Francisca eAline Rodrigues, jornalista da Periferia em Movimento que assina este texto e também é mãe da Helena, de 6 anos. Veja a conversa na integra:

Desafio

Já no primeiro semestre, pode ser testado o ensino híbrido, a distância e presencial, com a diminuição da capacidade de crianças por sala. E o desafio continua, ainda não sendo possível as crianças acessarem todas as dependências e potencialidades da escola.

A EMEI Cartola, onde Valdeci atua, fica no Parque independência, no Capão Redondo (zona Sul de São Paulo). Durante toda a pandemia, a unidade criou alternativas para manter o contato com as famílias e as crianças.

Nem todas as famílias tiveram e ainda tem acesso as plataformas tecnológicas que foram disponibilizadas e a escola foi experimentando alternativas como grupo de WhatsApp e o Facebook para passar atividades para que todes tivessem acesso à informação.

A escola promoveu empréstimo de livros, priorizando as crianças que estavam em casa, compartilhou contações de histórias, brincadeiras, oficinas de confecção de brinquedos, sempre propondo a interação das crianças, pedindo que enviassem fotos e vídeos do que faziam das atividades em casa.

Pensar com as crianças seus direitos

“Na terra do adultocentrismo, só adulto falava, só adulto era ouvido, só adulto era visto como pessoa sabida. E parecia tão verdadeira essa ideia que todo mundo achava mesmo que só adulto é que sabia das coisas”, este é o trecho do conto “A vida na terra do adultocentrismo”, escrito por Elânia Francisca, psicóloga do Espaço Puberê e publicado em sua coluna no UOL Viva Bem. Ele traz essa provocação de uma suposta ficção em que só adultos são levados em conta, mas que dialoga muito com a realidade que vivemos.

Alinhada a esse olhar, a professora Valdeci conta da importância de escutar as crianças para encontrar caminhos possíveis na escola, mas para além do ambiente escolar também. “Temos esse exercício do ouvir para depois oferecer. Nós adultos pensamos coisas mirabolantes”, diz ela.

A partir da escuta das crianças, Valdeci encontrou soluções com elas para viabilizar a retomada do presencial já no começo do ano. Ela avalia também que receber um número mais restrito de crianças funcionou como um teste para adaptação gradativa de todes e retomarem agora em agosto mais preparadas para uma acolhida mais efetiva por parte da escola.

“Elas ficaram durante um ano fora do espaço, então chegam ansiosas pelo parque”, lamenta Valdeci, explicando que ainda não é possível acessar os espaços livremente e é um diálogo importante com as famílias também que em alguns momentos perguntam sobre a alfabetização e a possível defasagem da ausência da escola nesse período.

Mas elas são acalmadas com a explicação de que esse é o momento do aprender durante a brincadeira, “exercer o seu direito do livre pensar, de conhecer as texturas, as formas, de uma forma lúdica, explorar os espaços”.

Afinal, 90% do cérebro se desenvolve até os 6 anos de idade e esse é um período importante para promover oportunidades de desenvolvimento para as crianças e tudo vale como estímulo ao aprendizado de compreensão do mundo. Inclusive, há alguns anos as crianças da EMEI Cartola têm a oportunidade de aprender também pela vivência da Imprensa Mirim, a qual, Valdeci participa.

Confira uma produção de 2018 feita por algumas crianças:

Este conteúdo tem o apoio da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal. Nas próximas semanas, serão publicadas novas reportagens sobre Primeira Infância, Escola e Direitos Humanos. Acompanha em nossas redes.

1 Comentário

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