Por Thiago Borges. Foto em destaque: Instituto Butantan / Divulgação
Festeira convicta, Deise Alves dos Santos Silva sempre gostou de comemorar seus aniversários com familiares e amigos. Por conta da pandemia, já são 2 anos sem celebrar a data do jeito que ela gosta. A última festa que ela deu aconteceu em 2019, quando completou 41 anos. Mas a espera está acabando: “Hoje, meu sentimento é de esperança, de acreditar que a cura está bem próxima”.
Deise recebeu a primeira dose da vacina da AstraZeneca em janeiro e, no último dia 28, a segunda dose. Ela segue rumo à imunização contra a covid-19. Auxiliar de saúde bucal em uma unidade básica de saúde (UBS) no Brooklin, a moradora de Cidade Julia (na região de Cidade Ademar, zona Sul de São Paulo) vislumbra um futuro “sem máscara”, com uma volta à normalidade.
Esse ainda é um cenário distante para boa parte da população brasileira, que chega a mais um feriado de 1º de maio com poucas perspectivas. A data marca a luta por direitos trabalhistas ao redor do mundo e, pelo segundo ano, é atravessada pela pandemia de coronavírus. Porém, se em 2020, havia muitas dúvidas sobre o enfrentamento à doença e era grande a preocupação com trabalhadores essenciais e informais que precisavam circular, hoje temos conhecimento das principais medidas de combate e os maiores erros cometidos.
Depois de 1 ano, chegamos à catastrófica marca de mais de 400 mil vítimas fatais da doença no Brasil, diante de uma gestão do governo federal que incentiva aglomerações e boicota medidas de prevenção, como uso de máscaras e pagamento de auxílio emergencial. O número de mortes cresce rapidamente, mesmo com a existência de vacinas eficazes para a doença. São 30 milhões de pessoas que receberam a primeira dose apenas 6 % da população do País está totalmente vacinada.
E é justamente essa proteção que Deise desejam ao restante do povo. “Trabalhar no SUS só me faz acreditar que a saúde pública salva, apesar de suas pequenas falhas”, ressalta.
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Alívio
A vacina trouxe a sensação de que há uma luz no fim do túnel. A travessia, entretanto, foi marcada por medo e angústia.
“Lidar com a pandemia no inicio foi torturante, porque não sabíamos o que viria pela frente”, diz Deise, que atua na área há 12 anos. Ela teve crises de ansiedade e até se afastou do trabalho por uma semana por uma falta de ar que gerou a suspeita de covid-19 – o resultado deu negativo, mas nesse período ela precisou ficar isolada do marido e dos sogros, que moram no mesmo quintal que ambos.
As crises diminuíram à medida em que a pandemia “entrou na rotina”. Uma roda de conversa virtual com a psicóloga do posto foi um caminho para compartilhar os problemas e encontrar algum conforto.
A queda nas infecções permitiu o reencontro com familiares, mas os temores voltaram com a segunda onda e a nova alta nos casos no início de 2021. Há 2 meses, o atendimento no dentista do posto foi interrompido novamente e o grupo de saúde mental precisa voltar a funcionar. “Tem dias que estou bem, mas tem outros em que falta ar”, diz ela, que só fica mais tranquila por ter sido vacinada, assim como seus pais.
Quem também respira mais aliviada é Adriana Freire, de 49 anos. Moradora de Cidade Tiradentes, ela pegou a doença e ficou internada no final do ano passado. Agora, está mais segura para continuar o trabalho como coordenadora pedagógica em um centro de educação infantil (CEI) na zona Leste de São Paulo. Recentemente, Adriana tomou a primeira dose da vacina contra a covid-19, assim como outros educadores com mais de 47 anos de idade.
Na escola, os desafios continuam. O primeiro deles foi a adoção de ferramentas digitais como o whatsapp. “Muitos profissionais tinham dificuldade de acessar esses recursos. Eu sou uma delas e tive que reaprender”, conta. Pais e responsáveis das crianças também vivenciaram essas dificuldades, e a unidade teve papel fundamental para facilitar a comunicação.
Hoje, o CEI atende até 35% das crianças matriculadas presencialmente – o restante, tem aulas à distância, o que se coloca como mais um obstáculo. “A interação com as crianças reduziu bastante. A ideia de educação que nós tínhamos retrocedeu. Nós tivemos que dar dois passos pra trás”, salienta Adriana. “Temos algumas dificuldades ainda ao longo do caminho, mas estamos indo”.
A Periferia em Movimento segue ouvindo relatos de trabalhadoras e trabalhadores sobre o cotidiano na pandemia. Você pode participar escrevendo para o whatsapp (11) 957816636.
Thiago Borges