Por Thiago Borges. Foto em destaque: Divulgação / Bell Lima Joias e Acessórios
Brincos, anéis, colares e pulseiras feitos de cápsulas de café e outros resíduos: essa é a proposta da Bell Lima Joias e Acessórios de Impacto, um ateliê criado por Elizabeth Lima Teixeira, de 61 anos, junto a seu filho – e que hoje ela quer fazer crescer por meio de trocas e parcerias.
A moradora de Cascadura, Zona Norte do Rio de Janeiro, iniciou o empreendimento a partir de um drama pessoal. Em 2008, Elizabeth descobriu um câncer de mama. Então trabalhadora do mundo corporativo, ela buscou alguma atividade que desse força em seu tratamento. Começou pela costura, mas logo migrou para as bijuterias. Ela confeccionava peças e levava de presente para as amigas das sessões de quimioterapia. “Elas estavam baixo astral. Queria animar”, lembra.
A oportunidade de negócio ficou mais nítida quando Elizabeth assistiu a uma reportagem na TV sobre o descarte inadequado de cápsulas de café – e de como uma artesã em Portugal estava gerando renda a partir daquilo. Depois de investigar sobre o assunto, ela começou a coletar cápsulas usadas entre amigos e conhecidos e, desde então, ressignifica os materiais que antes iam direto para o lixo.
“Ano passado, na pandemia, lancei uma coleção de folheados, tudo feito com a borra e a cápsula do café”, diz Elizabeth, que formalizou o negócio em 2011. “Foi o empreendimento que me deu força e garra para continuar”, prossegue.
Elizabeth encontrou a cura e abriu caminhos para chegar a mais espaços, como o Impacta Mulher, uma incubadora para empreendimentos de periferias e favelas cariocas criada pela Asplande. “Essas mentorias me fizeram pensar profissionalmente e estruturar meu ateliê. Ainda tenho muito que melhorar, mas tenho minha empresa nos trilhos, com pensamento profissional”, ressalta Elizabeth.
Por fazer parte dessa rede, ela foi indicada a participar de um ciclo de encontros on-line que promovem trocas entre 12 empreendedores de periferias de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Pernambuco. Realizado pelas organizações A Banca, do Jardim Ângela (Zona Sul de São Paulo), e Instituto Procomum (da Baixada Santista), o projeto tem apoio do Programa DICE (Developing Inclusive and Creative Economies) do British Council. Saiba mais aqui.
“Tenho a impressão de que o mercado pós-pandemia vai se sustentar através de parcerias, da coletividade”, anima-se Elizabeth. “Já tô tentando fazer parceria com os meninos da tecnologia [do Porto Digital, de Recife] e também vejo o Lá da Favelinha [de Belo Horizonte] como possibilidade de realizar alguns desfiles de moda”.
O Centro Cultural Lá da Favelinha é um espaço comunitário e de formação profissional, que atende, principalmente, crianças e jovens da comunidade do Aglomerado da Serra, em Belo Horizonte. Moradora do mesmo bairro, Isabella Rodrigues Silva teve seu primeiro contato com a cultura urbana no Lá da Favelinha.
A jovem de 18 anos participou de danças performáticas e conheceu a moda sustentável no espaço cultural. “Iniciei meu primeiro trabalho da vida no ateliê Remexe Favelinha”, diz ela, que há alguns anos criou com amigos a marca de roupas tingidas D’Aquarela, que está com as atividades temporariamente paralisadas.
Com o ciclo de encontros, ela se reencontrou como empreendedora e teve novas ideias de negócio. “Hoje em dia penso muito em ter uma marca de biquínis e também em construir um estúdio fotográfico”, diz Isabella.
Representatividade
A articulação em rede para viabilizar pequenos negócios de impacto social também é a aposta de Gláucia Rodrigues, de 33 anos. Natural de São Vicente (SP), ela mora na cidade de São Paulo e é responsável pela marca de roupas 370. “Sempre fui apaixonada por moda. E venho de uma família de costureiras, com mãe, tia, avós nessa área, porém não achava que a moda era uma profissão para mim”, explica.
Após se formar em comunicação, Gláucia tentou se encaixar na área. Sem sucesso, se reencontrou com sua vocação criando uma marca inclusiva e ambientalmente responsável.
“Como princípio, quis fazer uma moda que me incluísse e incluísse pessoas como eu: corpos fora do padrão e que vivem em movimento”, salienta. “Desta forma, criei uma marca que fazia roupas sob medida para atender diversos corpos e com tecidos provenientes de garrafas pet”, explica.
Gláucia envolveu as familiares na iniciativa. Porém, os últimos meses não têm sido fáceis. Ela compra os tecidos de pet de uma empresa no Sul do País, mas os itens ficaram mais caros e escassos com a pandemia – e ela precisou voltar ao mercado de trabalho formal. Por isso, os encontros vieram em boa hora.
“O programa é uma forma de me reconectar com pessoas ‘fazedoras’ para que a 370 ganhe novo fôlego e, se possível, eu possa ajudar outras pessoas a se beneficiarem do seu próprio fazer”, acredita.
Para Luciana da Cruz, de 49 anos, a articulação é fundamental para encontrar forças nas dificuldades e se manter de pé. Moradora de São Vicente, ela é responsável pela marca Lumimus , em que reutiliza jeans para criação de acessórios, bolsas e peças de decoração. Em novembro de 2018, quando participava com seus produtos da 1ª feira cultural Afro Santos, ela mobilizou outros artesãos negros ao perceber as necessidades e dificuldades de seus colegas para tocar os negócios. Surgiu assim o coletivo AfroTu, formado por 34 pessoas.
“O que eu vislumbro é entender como ajudar colegas afroempreendedores do coletivo, das comunidades da Baixada Santista”
Luciana da Cruz
Em Itaquera (Zona Leste de São Paulo), o Coletivo Meninas Mahin também realiza feiras para fortalecer o trabalho de empreendedoras negras. A iniciativa surgiu em 2016, a partir de ações afirmativas com oficinas de turbante e tranças. “Notamos a importância de ter um espaço contínuo pra fortalecer afroempreendedorismo e disseminar a cultura com artistas locais”, explica Ednusa Ribeiro, de 42 anos, que faz parte do grupo cujo nome é uma referência a Luiza Mahin, líder da Revolta dos Malês e mãe do advogado abolicionista Luiz Gama.
Com mais de 70 integrantes que desenvolvem artesanato, roupas, acessórios e itens de decoração com a temática africana e afrobrasileira, o coletivo estava em expansão e chegou a realizar 70 feiras em 2019. Com a pandemia, o grupo atua em formato híbrido, com vendas por meio do site e das redes sociais.
“A gente também tirou um período para se reestruturar, organizar, estudar”, explica Ednusa, que dessa forma chegou ao ciclo de encontros on-line. “O que a pandemia deixou latente foi a oportunidade de ampliar as redes para outras regiões por meio digital”, completa.
Essa é a segunda de uma série de 3 reportagens da Periferia em Movimento sobre os encontros realizados por A Banca e Instituto Procomum, com o apoio do Programa DICE (Developing Inclusive and Creative Economies) do British Council.
Thiago Borges
5 Comentários
[…] maioria dos relatos é pautada na violência doméstica, no processo de lutas reais ou simbólicas, como desemprego, relacionamentos e na maneira em que […]
GRATIDÃO!!!
Resistência, é a palavra para atravessar a crise, instaurada pela pandemia. Parabéns MAHINS
Coletivo Meninas Mahin, resistindo e ensinando a resistir no meio da crise, instaurada pela pandemia. Parabéns MAHINS
[…] mulheres periféricas da Zona Sul da capital paulista. Com a pandemia de coronavírus, articulou doações e distribuição de cestas básicas, incluindo absorventes, além de atendimento assistencial e […]