“A periferia não cabe no plano de ação da Secretaria Municipal de Cultura”.
Com essa argumentação, o Movimento Cultural das Periferias (MCP) convoca coletivos e agentes culturais das bordas da capital paulista para um encontro aberto nesta terça-feira (14/05), a partir das 19h, no Centro Cultural da rua Ouvidor, 63 – centro de São Paulo. O objetivo é avaliar a incidência do movimento na Secretaria Municipal de Cultura (SMC), responsável pelas políticas culturais na cidade, hoje sob o comando de Alexandre Yousseff.
“A gente tá percebendo que eles estão dando uma engambelada na gente, colocando [nossas demandas] no discurso deles de uma forma rasa e eleitoreira”, avalia Pablo Paternostro, integrante do MCP, que reúne mais de 400 coletividades das margens paulistanas.
O clima azedou de vez na semana passada, no dia 30 de abril, quando Yousseff apresentou o plano de ações estratégicas “São Paulo, capital da Cultura” ao lado do prefeito Bruno Covas. O plano reúne questões como a integração do calendário, valorização da memória, ocupação cultural da cidade, fomentos e pertencimento dos equipamentos públicos, além da difusão literária, fortalecimento do audiovisual, reencontro com os valores modernistas e o reconhecimento da potência cultural da cidade pelos fóruns internacionais. As periferias não são citadas na proposta.
Assista ao vídeo:
Treta antiga
Não é de hoje que agentes e coletivos culturais das periferias enquadram quem ocupa a SMC. Desde o início da gestão de João Doria na Prefeitura, quando André Sturm ocupou a pasta e entrou em conflito com agentes culturais, diversos movimentos têm denunciado ações de irregularidade, falta de diálogo e centralização das tomadas de decisão.
Yousseff assumiu o comando da pasta no início de 2019 e, em 12 de março, participou da audiência pública cidadã promovida pelo MCP para apresentar as demandas de quem faz cultura e arte nas margens.
Na apresentação feita em março, o MCP defendeu a descentralização dos recursos públicos, apresentou um panorama do cenário e das políticas públicas culturais para as periferias de São Paulo, incluindo pautas mais emergentes de cada linguagem e circuitos artísticos alinhadas ao histórico e a implementação do Plano Municipal de Cultura aprovado em 2016. Confira aqui a apresentação e aqui a carta-compromisso.
No encontro, Yousseff selou o compromisso de criar uma comissão para implementar o sistema municipal de cultura (com conselho, plano e fundo municipal) e acompanhar a execução do orçamento com participação de integrantes do movimento e do poder legislativo. Também ficou acordada a criação de comissões por linguagens artísticas para executar pautas apresentadas na audiência.
“Fizemos mais duas ou três reuniões com a SMC e quase nada de avançou, não teve retorno oficial”, explica Pablo.
Em paralelo a isso, a SMC publicou um edital para selecionar uma organização da sociedade civil para realizar a Virada Cultural 2019, que acontece no próximo final de semana (dias 18 e 19 de maio). Com um montante de R$ 9,4 milhões, a instituição vencedora deveria planejar, produzir, executar e monitorar as atividades do evento, sendo responsável pela infraestrutura, equipamentos, equipe técnica e operacional.
O Instituto CP Brasil inscreveu uma proposta e entregou os documentos a tempo de fazer a apresentação pública no dia 22 de abril, conforme previsto no edital. Mas no dia seguinte a SMC cancelou o edital por considerar conveniente organizar ela própria a Virada Cultural.
“Eles podem revogar o edital? Podem. Mas se você é administração pública, você não pode ‘não dar’ satisfação do cancelamento”, observa Jaíra Rodrigues, gestora do instituto. “A gente trabalhou durante um mês. A gente pensa a cidade e pensou a virada como patrimônio imaterial da cidade”, completa.
Na semana seguinte, durante a apresentação do plano “São Paulo, cidade cultural”, Jaíra subiu ao palco do Centro Cultural São Paulo e fez uma intervenção, lembrando a Yousseff os compromissos que assumiu com as coletividades periféricas, especificamente com o grupo de trabalho sobre patrimônio, do qual ela faz parte. “O que a gente falou pra eles sobre patrimônio passa longe”, diz Jaíra.
“Bem, o secretário oriundo do Baixo Augusta e empresário da ‘naite’ falou enfaticamente sobre o DNA da cidade e pasmem, a cidade dele(s) não possui o DNA dos meus ancestrais – negros e indígenas!”
diz a carta escrita após o evento e publicada nas redes do MCP.
“O que a gente tá vendo não é uma secretaria de Cultura, e sim uma agência de publicidade”, aponta Jaíra. “A agência tá criando uma campanha para um cliente, e esse cliente é o Bruno Covas”.
Confira abaixo o relato sobre a intervenção:
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