Periferia sofre com a criminalização das drogas

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A abordagem sobre dependência química passa, inevitavelmente, pelo debate sobre a descriminalização ou mesmo a legalização das drogas.

Os últimos meses foram marcados por notícias a respeito do controle do governo do Uruguai sobre a produção e venda da maconha no país e pela legalização da erva nos estados do Colorado e Washington, nos Estados Unidos.

E no Brasil, há ventos favoráveis à discussão sobre a discussão.

Idealizado na Marcha da Maconha, o Coletivo DAR (Desentorpecendo a Razão) reúne especialistas com o objetivo de discutir a política de drogas e suas interfaces e como essas drogas podem ser utilizadas da forma mais livre e responsável possível.

Para Raul Carvalho Nin Ferreira, militante do Coletivo DAR, a participação da periferia nesse debate é ainda mais importante, já que a criminalização das drogas “permite o controle policial” desses territórios – vide casos como o de Amarildo, o ajudante de pedreiro carioca levado por policiais da Unidade de Polícia Pacificadora da Rocinha em julho do ano passado e, desde então desaparecido. Uma das justificativas do comando da PM do Rio era de Amarildo tinha envolvimento com o tráfico.

As pessoas dizem que a legalização provocaria um caos na periferia, mas isso não ocorreria pelas drogas e sim porque nossa sociedade é excludente e capitalista”, diz Raul.

Para Bruno Ramos Gomes, educador do centro de convivência É De Lei, também é necessário haver uma mudança para além da descriminalização, em que o usuário de drogas não seja tratado meramente como uma doente mas que se reconheça o uso das substâncias de forma recreativa.

Redução de danos

A política de redução de danos tem como objetivo não a abstinência ou o fim do uso da substância, mas a construção do diálogo com o usuário.

Alguns você ajuda a parar de usar, outros você reduz o uso, e com alguns substitui a droga por outra ou procura ajuda médica para eles”, explica Bruno, do É De Lei. Esse modelo surgiu com o combate à AIDS, em que usuários de drogas ganhavam seringas novas para evitar o contágio pelo compartilhamento.

Com oficinas, exibição de filmes e apresentações artísticas, o É De Lei busca acolher pessoas em situação de drogadição e ajudar nos cuidados com a saúde.

Nas ruas, os “agentes redutores de danos”, como são chamados os trabalhadores e voluntários do É De Lei, também distribuem seringas para uso compartilhado de drogas injetáveis e, com isso, evitar a transmissão de DSTs. Camisinhas também são distribuídas.

Os agentes do É De Lei apontam que o serviço público de atendimento aos dependentes é pensado na perspectiva da redução de danos, mas os funcionários não têm formação adequada e agem segundo o senso comum.

Além disso, haveria um viés político entre os interessados no programa de combate o crack do governo federal em detrimento aos Centros de Apoio Psicossocial (CAPS), mais próximos da política de redução de danos.

Existe uma disputa muito forte pelo dinheiro e não é a eficiência que norteia, mas os acordos políticos”, diz Raul, do Coletivo DAR. “Mas na hora de executar, essas políticas acabam contaminadas com interesses diferentes, como as comunidades terapêuticas, que receberão dinheiro do SUS”, diz.

Por meio do programa “Crack, é possível vencer”, o governo federal mantém 5.088 vagas para recuperação de dependentes em 236 comunidades terapêuticas, segundo informa a Secretaria Nacional de Políticas Sobre Drogas (SENAD) do Ministério da Justiça.

Foto: Marcha da Maconha em Brasília, no ano passado (Marcello Casal Jr./Agência Brasil)

PRÓXIMA REPORTAGEM: Quem tá no extremo não tem opção, tem condição. Porque aqui ninguém vai te oferecer nada. É o imediatismo que faz o cara ir para o tráfico”, aponta Marcos Lopes, que criou o Projeto Sonhar para apresentar alternativas a jovens envolvidos com a criminalidade. 

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