Candidaturas periféricas prometem “representatividade real” de pessoas negras, jovens e mulheres

Candidaturas periféricas prometem “representatividade real” de pessoas negras, jovens e mulheres

Eleições de 2022 são marcadas por números recordes de candidaturas de grupos com menos direitos garantidos e maior engajamento da juventude

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Por Julia Vitoria. Edição Thiago Borges. Artes: Rafael Cristiano

Aos 25 anos de idade, Keila Pereira está disputando sua terceira eleição. Candidata a deputada estadual em São Paulo, ela já concorreu ao mesmo cargo em 2018 pelo extinto Partido Pátria Livre (PPL), quando conseguiu 1.413 votos. Em 2020, tentou se eleger vereadora pelo PC do B e obteve 1.772 votos. Agora, pelo mesmo partido, quer representar na Assembleia Legislativa (Alesp) o lugar de onde vem: o distrito de Parelheiros, no Extremo Sul da capital paulista.

“Nossa campanha se concentra nos temas de educação, cultura, trabalho e mulheres, principalmente. É nossa prioridade descentralizar o serviço público”, diz ela, que é a favor da criação de escolas técnicas e delegacias de defesa da mulher nas periferias. “Começar por estudo e trabalho onde a gente mora é garantir melhoria na qualidade de vida das pessoas e esta é a importância”, completa Keila. 

As candidaturas de mulheres bateram um novo recorde este ano. São 9.844 pedidos em todo o País, o que representa 33,74% de concorrentes nas eleições de 2022, segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Apesar de serem 52,5% do eleitorado brasileiro, as mulheres ocupam apenas 15% das vagas no Congresso Nacional e 20% na Alesp. Por isso, Keila segue tentando se eleger, pois acredita que sua candidatura é uma necessidade.

“Seria muito pior largar o potencial de crescimento e representação que nós temos. Estamos falando de uma candidatura jovem, feminina e da periferia. Isso por si só é bom, mas ainda assim não representa tudo que precisamos”, completa ela, que neste ano já recebeu R$ 107 mil para fazer sua campanha.

O desafio de renovar a política sempre existiu e impulsionou um movimento no começo de 2022. Se o ano começou com o menor número absoluto de jovens de 16 e 17 anos com título eleitoral regularizado em janeiro (730.693), com a campanha de artistas e digital influencers esse índice se tornou o maior da história em maio (2.530.875), segundo o relatório da Girl Up Brasil, movimento internacional da Organização das Nações Unidas.

Não só com recorde de alistamento eleitoral de jovens, os resultados observados foram particularmente acentuados entre as meninas: 55% de adolescentes que escolheram votar são garotas – mais um recorde histórico para essa eleição.

“Ser uma mulher na política já não é fácil, muito menos sendo jovem, periférica, vinda de escola pública. Ter nosso discurso validado e respeitado vai ser um desafio diário. Caso eleita, terei que encarar – de maneira ainda mais intensa – a violência política de gênero”, acrescenta.

Contra o racismo

Em 2022, o número de candidaturas negras também é recorde. Segundo o TSE, das 26.398 candidaturas registradas, 49,3% são de pessoas pretas e pardas e 49,1% de pessoas brancas. Mesmo com esse aumento, o primeiro debate presidencial transmitido pela TV em 28 de agosto não tinha presidenciáveis nem jornalistas negres. E a existência de pessoas negras concorrendo ao pleito não necessariamente significa que a luta contra o racismo é pauta de todas elas.

“A minha principal luta é contra a mentalidade racista que aparelhou as instituições brasileiras desde sua concepção e que apresenta consequências até hoje. O racismo vai além. Ele atinge toda a raiz de oportunidades de uma pessoa preta e age principalmente de forma violenta sobre a nossa história, tentando negar o passado, não admitir os problemas no presente e querer tentar silenciar nosso futuro”, diz Emerson Osasco.

Vereador eleito em 2020 no município da região metropolitana de São Paulo que usa como sobrenome,  Emerson agora se candidata a deputado estadual pela Rede e quer  representar a população preta, pobre e periférica. “Ter alguém que nasceu na periferia, cresceu, sentiu as mesmas dores, as mesmas dificuldades  e que continua vivendo na periferia faz toda a diferença, inclusive no planejamento e desenvolvimento de projetos”, diz

Para isso, Emerson defende programas educacionais e de incentivo à cultura direcionados por instituições do movimento negro, medidas para coibir a violência policial, combate à evasão escolar e geração de emprego e renda a jovens vulneráveis, entre outras propostas.

“No Brasil, a juventude representa um quarto da população e mesmo assim é a parcela que mais sofre com o desemprego e a precarização do trabalho, principalmente jovens negros”, assegura.

Bancadas que representam

Uma andorinha só não faz verão. Em meio a centenas de parlamentares, é importante ter força para enfrentar retrocessos e pautar o que é de interesse da maioria da população.

E movimentos sociais colocaram como meta ocupar a política institucional. A Coalizão Negra por Direitos lançou a campanha Quilombo nos Parlamentos, que reúne mais de 100 candidaturas ao poder legislativo que são comprometidas com as pautas do movimento negro. No Estado de São Paulo, além de Emerson Osasco, compõem a lista o candidato Douglas Belchior (PT), o Quilombo Periférico (do PSOL, que parte de um mandato coletivo eleito em 2020 para a Câmara de Vereadores paulistana) e Erika Hilton (também do PSOL), entre outras.

Erika, aliás, é uma das 76 candidaturas de pessoas trans mapeadas neste ano pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra). Mais um novo recorde: o aumento foi de 44% sobre 2018, segundo a associação. Essa era uma tendência registrada nas eleições municipais de 2020, quando mais de 70 candidaturas LGBTQIA+ foram eleitas no Brasil todo.

Este ano também é o que tem maior número de candidaturas indígenas, 171 ao todo (0,62% do total). Com o objetivo de “aldear a política”, a Associação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) pretende formar uma bancada do cocar e apresentou 30 candidaturas de todas as regiões do País. O objetivo é formar e construir estratégias de luta política para garantir direitos dos povos originários.

Vale ressaltar que o voto representativo é ainda novo, considerando todo o histórico de apagamento, escravidão e exclusões sobre determinados grupos sociais na história brasileira. Somente em 1934 as mulheres passaram a ter direito ao voto. No entanto, pessoas analfabetas ainda eram mantidas de fora. Foi em 1985, após o fim da ditadura, que começamos o processo da nova Constituição, que ficou pronta em 1988. Nela o voto se torna de fato universal, incluindo pessoas analfabetas e jovens de 16 e 17 anos.

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