Longe dos estádios, pessoas tentam garantir direito ao esporte na pandemia

Enquanto atletas profissionais disputam títulos e medalhas, na quebrada população busca meios para se movimentar com menos risco de contágio

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Por Paula Sant’Ana*

Orientação de reportagem: Gisele Brito. Edição de texto: Thiago Borges. Artes: Rafael Cristiano

Você está se mexendo nessa pandemia? Neymar, Messi e companhia estão. Depois de toda a discussão sobre realizar uma competição esportiva em meio à pandemia, a Copa América chegou ao fim no sábado (10/7), com vitória da Argentina sobre o Brasil. No domingo (11/7), a final foi na Eurocopa, com Itália ganhando da Inglaterra. Campeonatos de futebol e outras modalidades seguem rolando, e o mundo tá na contagem regressiva para os Jogos Olímpicos de Tóquio, que começam em 23 de julho. Enquanto atletas disputam títulos e medalhas, como nós pessoas comuns podemos exercer o direito ao esporte nesse cenário?

“Os benefícios do esporte estão para além do físico. É importante porque a atividade maximiza os capitais humanos: físico; mental; individual; econômico; social; cognitivo e espiritual”, aponta o instrutor Fabrício de Moraes, de 40 anos. 

Morador do Jardim São Luís (zona Sul de São Paulo), ele ressalta a importância do esporte como um direito que precisa ser assegurado para o bem estar da população. A questão é como fazer isso em segurança.

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Nesse vai e vem das fases do Plano São Paulo, instituídas pelo Governo do Estado, as academias particulares estão funcionando com atendimento parcial. Entretanto, um estudo da Universidade de Stanford divulgado em novembro de 2020 revela que essas academias estão em segundo lugar na escala de maior chance de contaminação pelo coronavírus. 

Para a estudante Julia Rosa, de 17 anos, a solução é praticar em casa. 

“Sempre foi em casa, na varanda, no quintal. Eu gosto muito de treinar em casa porque não sou muito chegada à academia”, diz a moradora da Vila Formosa (zona Leste de São Paulo). No início, ela utilizava um aplicativo de celular para fazer os treinos. A prática se tornou uma paixão e, neste ano, Julia começou a cursar a faculdade de Fisioterapia para se aprofundar nas possibilidades corporais. 

“Eu fiquei uns 2 meses dentro do quarto, não fazia praticamente nada, só ficava deitada o dia inteiro”, diz a ex-sedentária, que mudou hábitos após sentir os efeitos da falta de movimentação.

O treinador Valdir Rodrigues, 32, nota um aumento desse tipo de reclamação desde o início da pandemia, quando muita gente precisou ficar em casa e passou a relatar dores na coluna e em outras partes do corpo. “O que eu vejo é que falta uma cultura de saber que, se você não estiver bem, nada vai estar bem. Então, cuidar da única casa fixa que você tem é essencial”, orienta ele, que dá aulas funcionais – exercícios baseados nos movimentos naturais do corpo. 

“Eu passo um pouco de exercícios musculares com o peso do próprio corpo, lutas como muay thai e boxe, corrida… Então a gente vai sempre diferenciando as atividades para que participantes possam ter a vivência de cada atividade cada vez que vão às aulas”, diz Valdir. Morador da periferia Sul de São Paulo, ele se encontra com as turmas nas praças do Campo Limpo e Vinicius de Moraes ou na Chácara do Jockey, entre outros lugares.

As práticas esportivas em ambientes ao ar livre, inclusive, são uma alternativa viável para quem quer se mexer. Uma reportagem da BBC de janeiro deste ano mostra que o risco de contágio nessa situação é praticamente nulo devido à dispersão de gotículas pelo ar – obviamente, respeitando medidas como uso de máscara e distanciamento de 2 metros.

Como tá a quebrada?

Considerando o atual cenário, também precisamos perguntar como as políticas públicas estão organizadas para garantir esse direito.

Na cidade de São Paulo, a Secretaria Municipal de Esportes e Lazer (SEME) informa que conta com 47 Centros Esportivos. Durante a pandemia, o funcionamento segue as determinações do Plano São Paulo. Atualmente, os CEs estão abertos das 6h às 18h apenas para caminhadas e corridas leves. A SEME conta com ações virtuais para incentivar a atividade física à população, como por exemplo, o programa Atividade Física em Casa, com suporte em vídeos de profissionais da pasta.

Clube Municipal Joerg Brudes, em Santo Amaro (Foto Paulo Dias/Prefeitura de SP)

Mas nem sempre o horário desses espaços públicos atende à realidade de pessoas nas periferias, que muitas vezes moram a longas distâncias dos equipamentos. Por isso, iniciativas locais ganham importância. 

Em outra quebrada da zona Sul, no Parque Regina, a própria comunidade se organizou para garantir um espaço adequado para fazer um esporte: a quadra da praça João Pais Malio, que já sediava jogos de futebol e outras atividades ao longo da semana. Pouco antes da pandemia, a população conseguiu cobrir e iluminar o local, viabilizando o uso durante a noite. 

“É um espaço de referência por conta de várias coisas que a gente já fazia há muito tempo. Então, as pessoas se sentem mais à vontade de praticar atividades ali”, explica o morador Marcio Bhering, 42, que pratica futsal nas manhãs de segunda, quarta e sexta, além de jogar vôlei à noite uma vez por semana. Mais do que usuário, Marcio é um dos responsáveis por articular o funcionamento. 

“Eu organizo a parada dos horários, troco uma ideia com todo mundo pra conseguir encaixar nos horários. Participo um pouco de cada coisa, na verdade. Direto, tô lá na quadra”. 

Essa mobilização na praça, que fica próxima ao metrô Vila das Belezas, vai de encontro a alguns ideais de identificação e cuidado com a própria região – fundamentais para reivindicar mais investimento público na área. “O poder público é importante, mas o poder público só vai atuar se esse corpo comunitário conseguir ter sustentabilidade”, completa Marcio. 

*Paula Sant’Ana é participante do “Repórter da Quebrada – Uma morada jornalística de experimentações”, programa de residência em jornalismo da quebrada realizado pela Periferia em Movimento por meio da política pública Fomento à Cultura da Periferia de São Paulo

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