Na Cidade Ipava, trampo de base contra os riscos de sexo “no pelo”

Na Cidade Ipava, trampo de base contra os riscos de sexo “no pelo”

Com 23 anos de atuação no Jardim Ângela, ativistas da ONG Conviver é Viver driblam preconceito e falta de grana para conscientizar população - especialmente a garotada - sobre os riscos do sexo desprotegido

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Tempo de leitura: 6 minutos

A cada transa, Vitor Souza descobre alguma coisa nova.

O adolescente de 17 anos, que mora na Cidade Ipava (bairro do Jardim Ângela), perdeu a virgindade há pouco tempo. Em casa, o assunto não rola com os pais. E, na escola, é pouco abordado pelos professores.

Sexo sem camisinha? Só uma vez. “Rolou no calor do momento, mas sempre uso”, garante Vitor. Mas a realidade da juventude é um pouco diferente.

O número de casos de garotos brasileiros do sexo masculino com idade entre 15 e 19 anos que estão infectados com o vírus HIV triplicou entre 2005 e 2014, enquanto está estável na maior parte dos públicos, segundo o Boletim Epidemiológico do ano passado. Clique aqui para acessar.

No Brasil, o Ministério da Saúde estima que 734 mil pessoas estão convivendo com o HIV. Em todo mundo, a cada três pessoas infectadas pelo vírus, uma tem entre 15 e 24 anos.

Além do HIV, preocupa o número de pessoas infectadas com vírus que provocam outras doenças, como a Sífilis. O número de gestantes infectadas, por exemplo, aumentou 360% em sete anos e chegou a 28 mil casos em 2015. Quase 1 milhão de pessoas foram contaminadas com esse vírus, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), que também estima 1,5 milhão de indivíduos com Gonorreia, 640 mil com Herpes genital e 685 mil com HPV (responsável por provocar o câncer do colo de útero, por exemplo).

Não é por falta de informação que esses casos têm aumentado, principalmente entre a juventude.

A maioria dos brasileiros (94%) sabe que a camisinha é melhor forma de prevenção às DST e Aids, porém apenas 55% da população sexualmente ativa usou preservativo nas relações casuais nos últimos 12 meses, segundo a Pesquisa de Conhecimentos, Atitudes e Práticas na População Brasileira (PCAP).

Ainda assim, somente 36% dos jovens se protegem sempre. E os que nunca usam camisinha chega a 26,8%, segundo a pesquisa Mosaico 2.0, realizada pelo Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo.

“Já identificamos chácaras onde acontecem pancadões, por exemplo, levamos camisinhas, fizemos oficinas, mas a molecada prefere o famoso ‘pelo no pelo’, que é a relação desprotegida”, diz Tábata Alves.

“Os meninos falam que a camisinha machuca, aperta, que não sentem nada. E, entre as meninas, muitas se apaixonam, se iludem e acham que são a única parceira do rapaz”, completa.

O sucesso do programa de combate às DSTs acaba gerando um efeito reverso entre os jovens. Entre as falas mais comuns, eles dizem que podem se tratar dessas doenças e, caso peguem o HIV, podem tomar o coquetel de medicamentos distribuídos gratuitamente.

“Mas eles não sabem os efeitos colaterais desses remédios. Tem gente que tem diarreia, alucinações, até se suicida porque não aguenta a carga”, nota Tábata.

Acolhida e informação

Tábata Alves: trabalho de base no Extremo Sul de São Paulo (Foto: Thiago Borges / Periferia em Movimento)

Tábata Alves: trabalho de base no Extremo Sul de São Paulo (Foto: Thiago Borges / Periferia em Movimento)

Além de técnica no serviço público, Tábata também é vice-presidente da ONG Conviver é Viver, organização pioneira que surgiu 23 anos atrás como fruto de um projeto criado por padres e freiras da paróquia de Piraporinha, na região do M’Boi Mirim, zona Sul de São Paulo.

Há 12 anos, a organização comprou uma casa na Cidade Ipava onde atualmente presta assistência a 51 portadores do HIV (vírus que causa a AIDS) que vivem na região. Além de oferecer café da manhã e almoço diariamente e doar uma cesta básica por mês aos soropositivos e seus familiares, os voluntários realizam acompanham o uso dos medicamentos, fazem rodas de conversa e ouvem os desabafos de quem convive com o vírus.

“Quando a gente chegou na comunidade, as pessoas não passavam na calçada porque achavam que pegava o vírus”, diz Tábata.

Sem convênios com o poder público, atualmente a Conviver é Viver mantém as portas abertas graças às doações de moradores da região e a venda de roupas usadas em um bazar. Assim, a organização consegue acolher e encaminhar pessoas aos centros de tratamento de referência, distribuir camisinhas gratuitamente e realizar o teste rápido por fluído oral que ajuda a identificar se a pessoa teve contato com o vírus HIV.

A casa também abre as portas para a comunidade com atividades culturais e aulas de balé, dança contemporânea, capoeira, acrobacia, teatro, entre outras.

Vitor, o menino do começo da matéria, começou a frequentar as aulas de balé há três anos. Hoje, ele é professor de dub step na ONG, mesmo lugar onde pega camisinhas e busca orientação. “A dúvida sempre surge depois que eu pratico. Daí, eu pergunto pra Tábata”, diz ele.

As oficinas são um pretexto para abordar a importância da prevenção às DSTs. “Assim, a gente espera atrair esses jovens para falar desse assunto também”, conclui Tábata.

2 Comentários

  1. […] de prevenção em um CTA (Centro de Testagem e Aconselhamento), Tábata é vice-presidente da ONG Conviver é Viver, que há mais de 20 anos atua com prevenção e aconselhamento de famílias no Jardim Ângela, […]

  2. […] anos, ela é agente de prevenção no Sistema Único de Saúde e atua como vice-presidente da ONG Conviver é Viver, que há mais de 20 anos atua com prevenção e aconselhamento de famílias no Jardim Ângela, […]

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