Sem sinal: A batalha pra solicitar o auxílio de R$ 600 onde o celular não pega

Em bairros como Barragem e Colônia Paulista (no distrito de Parelheiros, Extremo Sul de São Paulo), não "preenche nem um pauzinho" do sinal no celular. Por isso, moradores não conseguem fazer cadastro para receber auxílio emergencial

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Tempo de leitura: 6 minutos

Como outros 20 milhões de brasileiros, Cássia Aparecida Monteiro também tentou se cadastrar no sistema do governo federal para solicitar o auxílio emergencial de R$ 600 no período de distanciamento social. “Vai me ajudar a comprar mantimentos pra casa, pagar a conta de água que tá atrasada”, diz ela, que mora com o filho João Gabriel no Colônia Paulista, bairro localizado no distrito de Parelheiros (Extremo Sul de São Paulo).

O governo lançou o site e o aplicativo nesta terça-feira (07/04), gerando uma corrida entre quem depende do dinheiro pra enfrentar a pandemia de coronavírus. Mas um fator surpreendeu Cássia e outros moradores de bairros afastados das periferias: a necessidade de ter um número de celular para receber uma mensagem de texto com um código para confirmar a realização do cadastro.

O problema é que, a mais de 40 quilômetros do centro da cidade de São Paulo, milhares de pessoas estão fora da área de cobertura das empresas de telefonia móvel. “Pra receber o código, eu teria que subir em cima da laje pra tentar pegar sinal, porque a Vivo não pega aqui na minha casa. Nenhuma operadora pega. Tem que subir na laje, ir até o ponto de ônibus, não funciona direito”, conta Cássia.

Em 2019, uma reportagem do Desenrola e Não Me Enrola apontou que o extremo da zona Sul de São Paulo é “um ponto cego” na cobertura do sinal. A matéria mostra ainda que, de acordo com dados do mapeamento da Associação Brasileira de Telecomunicações (Telebrasil), existem mais 6.800 antenas de celular na cidade de São Paulo – a maior parte está concentrada nos bairros da região central.

Cássia e o filho. Detalhe para o print do celular: não há sinal de telefonia móvel

Para sorte de Cássia, uma sobrinha que mora na zona Oeste da cidade fez o cadastro pra ela. Mas nem todo mundo tem esse recurso. “Tem gente indo até o centro de Parelheiros pra usar o celular”, diz ela, referindo-se ao ponto mais urbanizado do distrito, a 06 quilômetros do Colônia Paulista.

Já o barbeiro Sidnei Silva Chagas tentou várias vezes obter o sinal, mas “nem um pauzinho” preencheu. Além da internet fixa lenta, o que faz o sistema ficar mais demorado, no bairro do Barragem ele também não consegue receber o SMS por falta de cobertura.

Sidnei mora com a esposa e 02 crianças e é microempreendedor individual (MEI). A esposa é cadastrada no Bolsa Família e vai receber o auxílio. “O auxílio e muito importante pra alimentação e outras coisas”, diz ele, que está sem trabalhar desde que o governo estadual determinou o fechamento dos comércios.

No site do governo federal, o Ministério da Cidadania explica que pessoas que não tenham celular ou acesso à internet podem fazer o cadastro presencialmente em alguma casa lotérica ou agência bancária da Caixa. Porém, não é uma medida tão simples.

Sidnei vai aguardar para ver se consegue receber o código por mensagem de texto. Caso contrário, precisará se locomover até a lotérica mais próxima, distante a 10 quilômetros de sua casa, ou na agência da Caixa, a 20 quilômetros.

Sidnei: barbeiro está sem trabalhar e tenta se cadastrar pra receber o auxílio

Além do trajeto de meia hora de ônibus, tem o percurso a pé. Sua irmã Sidineia Chagas, que também mora no Barragem, teria que andar 15 minutos até chegar ao ônibus. Como a Periferia em Movimento já relatou, o transporte público é insuficiente e há pessoas que caminham 1h para pegar o coletivo.

“Desde que começou o período da quarentena, eu não saí de casa. Eu acabo violando o distanciamento, mas pra pegar ônibus eu também preciso pagar a condução – e nem isso a gente consegue garantir às vezes”, explica Sidineia, que é educadora social. “Existe ciclo de dificuldades em que a gente já está inserido”.

Na porta de lotérias e agências da Caixa, as filas se estendem pelas calçadas, contrariando a própria recomendação do Ministério da Saúde de evitar aglomeração para prevenir o contágio de coronavírus.

Sidineia e o filho. No print da tela do celular, o sinal de telefonia móvel está ausente

Sidineia, que coordena o projeto de biblioteca comunitária no Colônia, agora trabalha em casa com apoio da organização. Mas com o distanciamento ela deixou de fazer trabalhos que complementavam a renda. Por isso, recorreu à irmã que vive em Interlagos para finalizar o cadastro e receber o auxílio emergencial. “Não é dinheiro do governo. É um dinheiro nosso, dos nossos impostos”, completa.

7 Comentários

  1. Iracema Maria da Silva disse:

    Moramos em um lugar esquecido pela sociedade Sidnéia um exemplo no nosso bairro corre atrás sempre si gratidão

  2. […] Periferia em Movimento – Como outros 20 milhões de brasileiros, Cássia Aparecida Monteiro também tentou se cadastrar no sistema do governo federal para solicitar o auxílio emergencial de R$ 600 no período de distanciamento social. “Vai me ajudar a comprar mantimentos pra casa, pagar a conta de água que tá atrasada”, diz ela, que mora com o filho João Gabriel no Colônia Paulista, bairro localizado no distrito de Parelheiros, no extremo sul de São Paulo. […]

  3. […] não atendem a nossa emergência. A fome não pode esperar análise ou regularização de CPF. Não rola sinal de celular nem baixar aplicativo Pic Pay onde mora quem mais precisa receber os R$ 55 da merenda escolar. […]

  4. […] Periferia em Movimento – Como outros 20 milhões de brasileiros, Cássia Aparecida Monteiro também tentou se cadastrar no sistema do governo federal para solicitar o auxílio emergencial de R$ 600 no período de distanciamento social. “Vai me ajudar a comprar mantimentos pra casa, pagar a conta de água que tá atrasada”, diz ela, que mora com o filho João Gabriel no Colônia Paulista, bairro localizado no distrito de Parelheiros, no extremo sul de São Paulo. […]

  5. […] Gabriel no bairro do Colônia Paulista (Parelheiros, Extremo Sul de São Paulo). Há 02 semanas, a Periferia em Movimento contou a história dela, que teve dificuldades para solicitar o auxílio num bairro em que não pega celular. Agora, a […]

  6. […] inadequada exigência de telefone, conexão à internet e e-mail para todas as pessoas se habilitarem ao […]

  7. […] de higiene  à negação de atendimento médico e os desafios para conseguir oauxílio emergencial. Além disso, cobravam do poder público medidas políticas direcionadas aqueles contextos e […]

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