MTST cria robô, automatiza horta comunitária e forma profissionais de tecnologia da informação

MTST cria robô, automatiza horta comunitária e forma profissionais de tecnologia da informação

Conhecido pela luta por moradia, movimento popular amplia frentes de atuação com projetos relacionados a educação, trabalho e segurança alimentar

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Texto e fotos por André Santos (Colaboração para Periferia em Movimento)

Edição: Thiago Borges. Arte: Rafael Cristiano

Conhecido nacionalmente pela luta por moradia popular, o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) tem ampliado as frentes de atuação – e uma delas chama atenção pela aposta em um futuro promissor. É o Núcleo de Tecnologia, formado por um grupo de profissionais que busca aliar as pautas que o movimento defende com o avanço tecnológico sustentável. O coletivo tem projetos em andamento relacionados a educação, trabalho e segurança alimentar. 

Iniciado oficialmente em outubro de 2020, o Núcleo de Tecnologia promoveu no início deste ano um curso semestral e gratuito sobre Python, uma linguagem de programação, na sede nacional do MTST em Taboão da Serra (região metropolitana de São Paulo). A turma piloto contou com 20 participantes, que se capacitaram e receberam certificados para ingressar no mercado de trabalho. E 5 dessas pessoas conquistaram uma vaga de emprego.

A experiência foi um sucesso e muito comemorada internamente, evidenciando que se trata de um projeto muito promissor para as periferias, possivelmente, de todo o País.

Para fortalecer e aprimorar o projeto, outras 5 turmas presenciais de Introdução à Programação foram iniciadas, além de uma sexta em formato EAD, que traz uma possibilidade de abrangência nacional. 

“Agora, estamos regionalizando. A primeira turma foi um grande teste para trazermos isso para a periferia, e nós estamos mostrando que sim, é possível alcançar nosso povo e capacitar para atuar nessa área, que é vista como distante”

Rita Souza, militante do MTST e uma das alunas que se certificaram na primeira turma

Hoje, Rita auxilia os instrutores Gabriel Drebtchinsky, Alexandre Boava e Marcos Woelz, que ministram aulas no Condomínio Dandara, um conjunto habitacional construído pelo próprio movimento na zona Leste de São Paulo. A procura por vagas no local foi tanta que uma segunda turma foi aberta na última semana, totalizando 46 pessoas matriculadas só nesse polo.

O curso acontece simultaneamente em outras 3 regiões, sempre aos domingos, sendo uma na Ocupação Nova Canudos (zona Norte), outra no Casarão (sede do movimento, em Taboão da Serra) e a última na região do ABC, sendo que esta é ministrada dentro de uma das cozinhas solidárias do movimento, que também conta com aulas de alfabetização.

Aula de programação em condomínio construído pelo MTST (foto: André Santos)

Baseado na metodologia da educação libertadora de Paulo Freire, o curso atende hoje cerca de 100 pessoas. De acordo com Renato Ramos, coordenador de projetos e uma das pessoas que idealizaram o núcleo, esse é só o começo. 

“Aqui, se cria um espaço de documentação de métodos didáticos para já prepararmos o material que futuramente vai rodar o Brasil inteiro. Já temos núcleos sendo formados em Pernambuco, Rio Grande do Sul e Minas Gerais”, conta.

Ainda de acordo com Renato, existem diversas parcerias sendo discutidas para que o curso tenha uma expansão e reconhecimentos à altura. “Temos também uma iniciativa de criação, que já está sendo executada, de um curso de extensão com a Universidade Federal do ABC (UFABC). A nossa ideia é poder certificar todos nossos estudantes, do Brasil inteiro”, continua.

O programador Gabriel Drebtchinsky, que é um dos responsáveis pelas aulas no Dandara, aponta que a área de tecnologia tem uma questão elitista de formação. “Esse problema de formação cria toda uma defasagem, porque tem todo um mercado com várias vagas abertas em um País com um monte de desempregado, o que não faz sentido nenhum”, completa.

Segundo a Brasscom (Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação), até 2024 serão necessários 420 mil profissionais para atuar na área, mas o Brasil só forma 46 mil pessoas por ano – dados que reiteram a fala de Gabriel.

Tal situação se torna ainda mais problemática quando analisamos o quadro de desemprego no Brasil. Hoje, são cerca de 13,2% da população, que em números brutos representam 13,7 milhões de pessoas, de acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), feita pelo IBGE e divulgada no fim de agosto.

Contrate Quem Luta

Outro ponto de destaque na atuação do Núcleo de Tecnologia do MTST é o assistente virtual Contrate Quem Luta, que opera pelo aplicativo de mensagens whatsapp. A iniciativa foi a primeira promovida pelo coletivo, tendo sido idealizado antes mesmo da formação do núcleo, que nasce com o intuito de fortalecer este projeto. 

O bot ou robô virtual se apresenta como Leon, nome de um dos principais responsáveis pela existência da ferramenta. O funcionamento é simples. Basta você acessar o site (clique aqui), que vai direcionar para uma conversa no whatsapp. 

Robô instalado em whatsapp direciona para pessoas que prestam serviços em diferentes áreas (Foto: Thiago Borges / Periferia em Movimento)

No aplicativo, basta enviar a mensagem “oi, preciso de um serviço”, indicando qual a especialidade que deseja contratar. Tem desde babá e balconista até costureira, DJ, motorista, segurança, entre outras. O robô pedirá a localização e, com base nela, indicará profissionais que estão nas redondezas, deixando as negociações a cargo das 2 partes envolvidas. 

“O nosso povo, que vive na periferia, que fica entre comer e pagar aluguel, precisa da nossa ajuda, esse é o grande objetivo do Contrate Quem Luta. A gente consegue trazer um trabalhador para ingressar em uma área com muitas vagas abertas. O grande objetivo é gerar emprego e renda”, conta Rita Souza.

Só neste ano, o serviço já gerou cerca de 3 mil oportunidades de trabalho e quem presta serviços define as regras de utilização em assembleias que ocorrem mensalmente. Atualmente, a área de atuação abrange os 39 municípios na região metropolitana de São Paulo. O objetivo é expandir para o restante do Brasil assim que possível. 

Automação na horta solidária

No campo da agricultura também existem progressos consideráveis, como por exemplo a automação dos processos e cuidados necessários para administrar corretamente as hortas gerenciadas por quem mora em condomínios e ocupações do MTST. 

A tecnologia auxilia com previsão de colheita, análise do solo, acompanhamento em tempo real e irrigação. Tudo isso preserva o solo, quantifica a colheita e poupa esforços manuais de quem trabalha cuidando do local, auxiliando as pessoas da comunidade a terem comida no prato por um preço justo.

Assim como os demais projetos, a tecnologia tem pretensão de ampliação por todo território nacional. Mas, para isso, ajustes devem ser feitos até que esteja tudo em pleno funcionamento, para evitar que eventuais oportunistas tomem a ideia para si. “O que está em jogo não é o lucro, mas a segurança alimentar. Temos isso bem forte”, conta Renato.

Em todas as iniciativas, percebe-se o poder popular em ação, contrastando com a ausência de políticas públicas nas periferias por todo o Brasil.

“Governo nenhum vai fazer trabalho de base. O trabalho de base é isso que nós estamos fazendo, que é dar autonomia pra sociedade tomar o próprio rumo. Nada é mais duradouro do que mudar a mentalidade da sociedade em torno da organização dos trabalhadores. Nada é mais forte que isso”, conclui Renato.

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2 Comentários

  1. Marcos Woelz disse:

    Uma honra poder fazer parte dessa história!! Marcos Woelz aqui expressando a mais profunda gratidão por essa reportagem. O Renato e o Gabriel me acolheram mesmo sem ser especificamente da área: sou arquiteto urbanista, que tem noções de lógica, mas não domino as linguagens trabalhadas: html, css, java e python: aprendiz como os demais alunos. Ainda assim, com todas essas limitações, o acolhimento dos colegas e a vontade de aprender desse povo de luta estão fazendo a mágica acontecer. As possibilidades de expansão desse projeto de inclusão são muitas: geoprocessamento, fab labs com impressoras 3D e corte a laser, criptomoedas sociais fortalecendo a economia local das ocupações. Trocas positivas entre movimentos de Reforma Urbana com os de Reforma Agrária também podem ser potencializadas: CSAs garantindo comida orgânica a preço justo + doção de excedentes para as Cozinhas Solidárias, agroflorestas urbanas complementando a alimentação das ocupações… VIVA O PERIFERIA EM MOVIMENTO!!

  2. […] do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Simões liderou um evento que contou com outros nomes do MTST, como a deputada estadual Ediane […]

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